Dedicado à Srª Dr. Hália Santos,
Directora do mais subsidiado boletim do concelho,
natural dos Valhascos
''18 de Agosto de 1912
O vigário do Sardoal é expulso dos Valhascos
No domingo à tarde começou a constar nesta vila a notícia de que o povo dos Valhascos houvera intimado o Vigário do Sardoal, Padre Silva Martins a não mais ali voltar a dizer missa.
Achamos o caso pouco edificante para a vida republicana deste concelho, que à falta de melhores informações, que dispusemos ir na segunda-feira até àquela fértil aldeia, que só conhecemos pela saborosa fruta e belos produtos hortícolas que abastece a nossa praça e a vizinha vila de Abrantes, são sempre os melhores onde aparecem.
Por isso o passeio era duplamente agradável, porque, além de irmos conhecer tão ubérrima povoação, íamos travar conversa com o povo que tem prestado os mais dedicados serviços à República.
Mas quando nos dispúnhamos para partir, aparece um amigo conhecedor dos factos que nos diz à queima-roupa: Não sabe, o povo de Valhascos num esforço acaba de expulsar de lá o vigário do Sardoal, que ali ia dizer missa aos domingos.
Este amigo estava ao facto de tudo, por isso, dispusemos a ouvi-lo, e desistimos do nosso passeio.
Eu lhe conto, diz-me ele:
Há bastante tempo nos Valhascos a ideia Republicana se vem desenvolvendo e frutificando com entusiasmo louco, podendo dizer-se, que está ali um verdadeiro baluarte, com que a República pode contar para a defender e consolidar quando for preciso, e ainda foi da última incursão paivante, que foi necessário fazer ronda nas estradas lá esteve o povo de Valhascos sempre, embora só em parte lhe coubesse o serviço.
No primeiro dia de vigia, o administrador mandou para lá dizer que precisava de 6 homens, apareceram mais de 30 todos armados, e daí, em diante nunca abandonaram a estrada, embora fossem em menor número, por verem que era desnecessário tanta gente.
Foi também entre todas as aldeias aquela que contribuiu em maior escala, para a carinhosa recepção , que fez ao Sr.Dr. Ramiro Guedes, quando como Governador Civil foi ao Sardoal.
Foi ela, que recebeu com o mais caloroso entusiasmo, quando ali foi em propaganda eleitoral fazer o comício.
Foi também aquele povo, que comprou e ofereceu o mobiliário para uma escola (que infelizmente ainda não funciona) o que lhe mereceu uma portaria do Ministério do Interior do Governo Provisório.
Todos estes actos conjugados, serviam para excitar a reacção e como ela não perdoa aos que flagelam e combatem, nascesse daí a propaganda contra aquele bom povo, dizendo-se “que Valhascos era um canto do inferno, gente de má raça e o incitamento às mais fanáticas a que mandassem os filhos aprender doutrina em prejuízo da escola”.
Tudo isto os republicanos vêm ouvindo com certa resignação, até ultimamente se reuniram em virtude das opiniões serem unanimes na expulsão do Padre, no passado domingo dirigiram-se todos ao adro da Igreja e ali chamaram o Padre Silva Martins, avisando então, de que de futuro não poderia vir a Valhascos, e que, naquele dia mal algum lhe aconteceria, mas que se teimasse em lá voltar sofreria as consequências do seu atrevimento.
Desejando saber as razões porque o expulsavam, foram respondidas que eram as que atrás citamos e dizendo ele que não era a opinião da maioria, foi feita a prova que lhe deu a triste desilusão de entre um, a multidão imensa, “só três fieis queriam o Sr.Vigário”.
De outras evasivas se valeu para ver se aniquilava o movimento, mas os resultados foram negativos, porque o povo respondeu com uma calorosa manifestação à Lei da Separação e ao Dr. Afonso Costa, manifestação que serviu para ele se pôr ao largo sem mais explicações.
Mas não imaginem que foi tudo isto de ânimo leve e autoritariamente, foi feito depois de uma reunião em que se viu o que era a opinião dominante do povo e se não o tinham feito no penúltimo domingo, foi porque o administrador do Sardoal, não sabemos porquê, nem porquê, ali mandou o Regedor e o Oficial de Diligências como guarda costas do Padre.
Mas ontem, houvesse o que houvesse e agora estarão todos os domingos dispostos a impedir a entrada do Padre, embora tenham de empregar a força, até que haja absoluta certeza de que ele já não volta lá a dizer missa.
Já o amigo vê, que nos Valhascos há uma opinião consciente e verdadeiramente democrática que defenderá a República sempre que seja preciso.
Assim terminou o nosso amigo o relato dos acontecimentos, que me sensibilizaram em extremo pela maneira ordeira, sensata, ponderada como procederam.
Mas antes de entrarmos na análise dos factos, uma pergunta ocorreu.
Porque o mandou o administrador, o Regedor Oficial de Diligências a Valhascos, sendo as autoridades de lá da sua nomeação e portanto de sua confiança?
Para defender o padre?
Para prender os que fossem intimar?
Isto é que era preciso saber-se para elucidação dos que amam e defendem a República!
Ao povo dos Valhascos a Redacção do Jornal de Abrantes, endereça as suas mais sinceras e calorosas saudações pela sua nobre e digna conduta, que é a única que no momento actual se deve seguir, para reprimir a reacção e castigar de inimigos da República e traidores da Pátria.
Alto exemplo de hombridade, prova frisante e claro patriotismo, foi o facto
praticado por aquele povo republicano.
Avante povo de Valhascos, pela Pátria e pela República!
Viva o Povo de Valhascos! Abaixo a Reacção! ''
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