Quarta-feira, 24 de Março de 2021

450º aniversário da elevação de Punhete a Vila

 e da autonomia administrativa do Concelho

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extracto da publicação inédita da carta régia de 30 de Maio de 1571, publicação da Academia das Ciências de Lisboa.

No próximo dia 30 de Maio de 2021 a Vila de Constância comemorará o 450º aniversário da sua elevação a Vila e da confirmação de iure (de direito) do seu Concelho, o qual  já existia  «de facto» à data da carta de sentença do Rei D. Sebastião, «com  toda a jurisdição». Segundo a petição levada ao rei, o lugar de Punhete (designação anterior de Constância) «não tinha outra diminuição», cita-se,  «somente irem os juízes antes que comecem a servir seus ofícios tomar juramento à Câmara de Abrantes», bem como as apelações terem de ir também ali primeiro, antes de irem à Relação do Rei. Na petição reproduzida na sentença, cita-se «grande inconveniente»  por causa  daquela diminuição da jurisdição e por causa dos presos detidos, das apelações, dos gastos, entre outros argumentos.

Até então o lugar de Punhete pertencia ao Termo de Abrantes. A carta régia de 30 de Maio de 1571 está registada nas folhas 97 a 99, do Livro de Registo nº 3 da Câmara Municipal de Abrantes (1). A separação do lugar de Punhete, com Termo separado do de Abrantes, e a sua elevação a Vila, deve-se  em parte,  sintetiza Morato, «por ser já então uma povoação de quinhentos vizinhos e prometer um progressivo aumento, em razão  da muita gente que de todas as partes ali afluía em romaria a Nossa Senhora dos Mártires, aliviando-a ao mesmo tempo do pagamento dos 400 réis anuais que, como ónus de sujeição, era obrigada a satisfazer à Câmara de Abrantes». (1)

O padre Carvalho da Costa, à semelhança de outras fontes antigas, dá-nos conta de que «El Rei D. Sebastião a fez Vila por quarenta homens honrados (sendo alguns deles de sua Casa) que com seus cavalos, e criados o acompanharam, quando foi a África, como consta de uma provisão do mesmo rei, que se conserva no cartório da câmara desta vila, que antigamente tinha seiscentos vizinhos».(2) Ao que se sabe por vários autores o invasor francês terá destruído os arquivos oficiais então existentes.

Segundo ainda Morato (1) em 1578 D. Sebastião escreveu ao alcaide-mor de Abrantes, D. João de Almeida. Com o propósito de levantar gente «para a  jornada de África». Na monografia que vimos seguindo adianta-se que o alcaide alistou bastante gente na Vila de Abrantes e suas imediações mas, prossegue Morato,  «ignoram-se os seus nomes, porque os historiadores desse tempo só nos transmitiam os dos grandes e nobres».(1)

Na nossa vila de Constância, então Punhete, se demorou o rei pela última vez por alguns tempos (por aqui se refugiou inicialmente da peste como relatam os cronistas), «fazendo convites à principal nobreza das vilas circunvizinhas para o acompanharem na jornada de África». É o que nos revela também, no caso, o autor da monografia de Constância do início do século XIX: «e desta vila o acompanharam quarenta cavaleiros de espora doirada que foram entregues a D.  Cristovam de Távora». (3)

Pêro de Alcáçova Carneiro, futuro Conde da Idanha, personagem muito influente no reinado de D. João III e durante a menoridade de D. Sebastião,  tinha terras em Punhete (6). Acredito que foi ele (Secretário do reino) que trouxe a Punhete a Regente Dona Catarina à Senhora dos Mártires onde também vinha em novena. Parece que caiu em desgraça em 1569 e se recolheu numa comenda da Ordem de Cristo em Idanha-a-Velha. Ora, em 1575, estava em Punhete (6). Nesse ano faleceu o padre Luiz Gonçalves da Câmara, confessor do rei, da família do Palácio da Torre de Punhete. 1576  é o ano da primeira reabilitação política de Pêro Carneiro, senhor de terras em Punhete.  Por decreto de 7 de Maio de 1576 entrou no governo, de parceria com Manuel Quaresma Barreto e D. Francisco de Portugal.  Segundo o  Dicionário Histórico Portugal, foi encarregado duma missão junto de Filipe II, tendo demostrado dupla habilidade como diplomata nas negociações com o ministro espanhol duque de Alba, conseguindo vantagens negociais para D. Sebastião. Sabe-se que depois, em Alcácer-Quibir, pereceram os seus dois filhos, Luís e Cristóvão. Logo a seguir à perda da batalha (Pêro Carneiro era Vedor da Fazenda e um dos cinco governadores que substituia o rei na sua ausência), foi preso pelo infante D. Henrique. Veio a ser reabilitado quando Filipe tomou conta disto, sendo nomeado Conde das Idanhas. É crível que este senhor de terras em Punhete tenha tido um papel no recrutamento dos cavaleiros da jornada de África. Já vimos que em 1577 o rei estava em Punhete nessa empresa que lhe veio depois a ser fatal. Será que Luís e Cristóvão moravam  também  em Punhete? É bem possível. É preciso investigar estas relações.

Retornando ao tema… Justiça seja feita, deve-se à Academia das Ciências de Lisboa a inédita publicação da carta de sentença Sebástica  favorável a Punhete, (4).

Na origem da carta régia está uma formalidade, claro. Mas de peso. O monarca refere uma petição dos juízes vereadores e procurador e povo do lugar de Punhete   em que  estes pedem  que o rei houvesse por bem «que o dito lugar se chamasse vila e que os juízes e oficiais não fossem tomar juramento à câmara da dita vila de Abrantes e que as apelações fossem directamente à minha Relação onde pertence(…)». (4)

Da carta régia consta que em Punhete havia dois juízes ordinários e três vereadores e um procurador do concelho e que estes oficiais,  «havia muitos anos que os havia e que tinham  todo o Regimento do Concelho e que assim havia um alcaide-pequeno que apresentava o alcaide-maior de Abrantes e a câmara conforme a ordenação e que havia dois tabeliães do publico e judicial, e escrivão da câmara e almotaçaria e juiz e escrivão dos órfãos contador inquiridor e dois procuradores do número juiz e escrivão das sisas e recebedor delas e que assim havia no dito lugar casa e audiência da câmara e casa da cadeia e pelourinho suas argolas e cepo e açougue(…)». (4)

 E antes de lhe dar despacho o rei mandou que o corregedor da comarca da vila de  Tomar fosse ao lugar de Punhete e se informasse do conteúdo na dita provisão. O parecer do corregedor satisfez a ordem e foi enviado o auto. Da sentença: «(…)e quero que daqui em diante para sempre se chame Vila de Punhete(…)».

Manoel da Veiga, biógrafo do «Sapateiro Santo», Simão Gomes, conta-nos  que o rei deferindo um pedido de Simão Gomes fez Punhete, Vila  (5). Parece que o lugar de Punhete era quase todo dos parentes de Simão Gomes. O rei teria sido muito bem recebido aqui quando se refugiou da peste e os locais, na altura certa, pediram a intervenção do «Sapateiro Santo»…

José Luz (Constância)

 PS - não uso o dito AOLP

(1)Memória Histórica da Notável Vila de Abrantes, Manuel António Morato, João Valentim da Fonseca Mota; organização e notas de Eduardo Manuel Tavares Campos, Edição de CMA,  1981, página 101.

(2)Corografia Portuguesa, tomo terceiro, padre António Carvalho da Costa, Lisboa MDCCXII, página 182.

(3)«Descrição da Villa de Punhete», por Veríssimo José de Oliveira, 1830, Transcrição, prefácio,  e notas complementares por José Eugénio de Campos Godinho, Torres Novas, 1947. Nota minha: a saudosa jornalista Manuela de Azevedo fundadora da Associação da Casa Memória de Camões em Constância,  disse-me um dia que tinha na sua posse este manuscrito original.

(4) «Cartas de vila, de mudança de nome e do título de Notável das povoações da Estremadura, Pedro de Azevedo, Coimbra, Imprensa da universidade, 1921, páginas 57 e ss.

(5) «Vida, virtudes e doutrina admirável de Simão Gomes»,  Manoel da Veiga, Lisboa, MDCCLIX.

(6) «Miscelânia Pereira de Foios», José Torrejon, 2017, Imprensa Nacional.

 

 



publicado por porabrantes às 15:10 | link do post | comentar

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