Ontem, no ''Expresso'', Miguel Sousa Tavares arrasava a política agrícola da ex-cacique de Casais de Revelhos. Com a devida vénia ao autor, reproduzem-se uns excertos:
''MARIA DO CÉU ANTUNES
Não sabe quem é, pois não, leitor? É a ministra da Agricultura, mas não admira que não saiba, pois ela própria parece não saber que o é. Ou seja: na minha nula experiência destas coisas, presumo todavia que, quando alguém chega a ministro de uma qualquer pasta, pelo menos sabe ao que vem, tem ideias sobre o assunto e políticas a implementar. No caso da agricultura e no caso português, o principal de qualquer política à partida está limitado por um recurso essencial e que, entre nós, é escasso e que todos sabem que cada vez irá ser mais escasso em dois terços do território: a água. Qualquer ministro da Agricultura responsável estaria em pânico com o que se está a passar no Alentejo com as culturas superintensivas de olival e amendoal à conta da água do Alqueva e com as estufas do Sudoeste à conta da exaurida barragem de Santa Clara ou com a recente moda devastadora do abacate no Algarve: tudo culturas predadoras de água instaladas nas regiões do país mais carentes dela. Mas a ministra não se incomoda. Assim como não se incomoda a tentar explicar se tem alguma política agrícola que não o deixar fazer, deixar andar, e também, olhando para os lençóis intermináveis de água que agora caem do céu, não vê necessidade alguma de se incomodar com a falta de água no horizonte. De facto, se 2020 já foi um ano de abundante chuva, permitindo que o Algarve não ficasse seco nas torneiras no Verão e que o ministro Cabrita fizesse reeleger o Presidente Marcelo, este está a ser o ano mais chuvoso desde há muitos. Para a ministra, por exemplo, não interessa que ande tudo à maluca a plantar um fruto exótico como o abacate no Algarve, em grandes plantações intensivas que secam os poços e os furos dos agricultores locais — interessa é que “a evolução tecnológica na gestão da água permite reduzir os consumos”, pelo que tudo é bem-vindo. E, além disso, tudo contribui para as exportações, não interessando saber também se, nos olivais do Alqueva ou nas estufas do Mira, todos os trabalhadores são estrangeiros e a maior parte das empresas também, tirando partido de infra-estruturas pagas pelos contribuintes portugueses, de água subsidiada pelos contribuintes portugueses e de subsídios ao investimento com dinheiro europeu do qual parte é nossa. Mas seria de facto curioso fazer as contas e perceber quanto do saldo final dessas exportações representam lucros que ficam cá, impostos e contribuições sociais que se pagam aqui. Para que desta agricultura industrial não fique apenas o rasto de uma situação social que nos envergonha e um desastre ambiental e paisagístico como aquele que cada vez mais vai crescendo no Alentejo.
Esta agricultura e este desprezo pelo ambiente vai matar tudo à volta por falta de água. Já não bastavam os eucaliptos e os golfes, os olivais e os amendoais, agora chegaram também os abacates. Santos Deus, não podíamos viver sem abacates? (....)''