Foi ali mesmo, à direita, na Rua da ilustre benemérita Dona Maria Balbino Franco, defronte da igreja da velhinha Irmandade da Misericórdia, quando se espreita vindo da praça. Aquele muro conta uma história, a história do dia em que o anão, o filho da regente, saltou, sem mais nem menos, lá de cima.
Rua D.Maria Balbino Franco, paralela à Igreja da Irmandade, onde se situa à direita o muro desta história…
O caso foi badalado: “Que teria passado pela cabeça do rapaz? “Ouvi esta história a várias pessoas e desde sempre. O anão (cujo nome fica resguardado na ficção) um dia resolveu pedir em namoro por carta, a filha duma personalidade local. Recebida a dita, a missiva deixou logo intrigada a destinatária, pela ousadia (pois era pessoa comprometida). Ora, dado o desconhecimento da identidade do remetente, logo foi abordado e indagado o carteiro. Disse o mesmo sem pestanejar: “Então a prima não sabe? Olhe, é o anão”. A carta, essa, foi devolvida pelo mesmo caminho, decisão que já estava tomada antes da mesma ter sido escrita. Mas o anão, teimoso, deu em ir fixar-se na fonte da praça, e olhava para a velha varanda da sua idealizada… Não havia trovas nem nada nesta sua incompletude. Ali estava, qual estátua, onde há muito se ia abeirar sem ter dado nas vistas. Décadas mais tarde, vi-o muitas vezes e nunca lhe ouvi a voz. Cruzávamo-nos quase sempre na rua de São Pedro (onde cumprimentei amiúde o O’Neill, este, talvez vindo da taberna do primo Mário Barbisco ou, quiçá, da pesqueira, dos seus banhos de Adão…). Em pequeno tinha algum receio quando passava pelo anão. As pessoas que não falam, nada dizem e nunca verbalizam o que pensam são para mim fonte dos maiores cuidados. E isto nada diz quanto à nossa personagem. São impressões. Dele tivemos notícia um dia, já idoso, no “Correio da Manhã” ou na “Capital”? Carlos, de seu nome, digamos que, fictício, estendia a mão na rua do Carmo, na capital. De oficio, palhaço. Reformado e sem pensão. Eis que finalizei o retrato. O país não poupa os seus artistas e os seus órfãos espirituais.
Fonte da praça onde a personagem se ia fixar…
Numa ocasião passou por ali a destinatária da sua carta de amor enviada 40 anos antes. Ia acompanhada pelo marido. Carlos escondeu-se e escondeu o rosto. Como se tivessem vindo à tona velhos fantasmas… daqueles, freudianos, que povoam os pensamentos humanos.
Quanto ao namorado que Carlos um dia queria substituir, posso testemunhar que o mesmo se ria do assunto, com bonomia. Só soube do sucedido anos mais tarde.
Naquela fonte da praça também tinha sido visto por “aqueles dias” de 1948, de noite, um ilustre constanciense, o qual andava a arrancar a propaganda do Norton de Matos. Pormenores do regime e da Legião…
O caso aqui relatado e ficcionado, parece ter posto de prevenção o carteiro, o qual todos os dias passava por força do ofício em sítio ermo junto à ponte. Uma sombra, anunciando uma silhueta de baixa estatura, parecia representar-se-lhe munida de uma faca em riste… O pobre do António viu-se assim em grandes apuros durante muito tempo. Talvez até em sonhos. Por causa da cegueira do anão e do seu amor platónico não correspondido. Será caso que o desgraçado do carteiro tenha sido o “bode expiatório” do anão, por ter devolvido uma carta como era de lei? Nunca o saberemos. Só sabemos que o anão se estatelou em queda livre, mesmo juntinho à igreja da Irmandade. O povo falava desta queda e falava também do escândalo do carameleiro que ficava logo, logo na esquina. O dono da pequena fábrica terá saído (outros dizem que fugiu) de noite mais a companheira: “filha (!) vamo-nos daqui” teria exclamado este vizinho do anão descoberto o “segredo”, não dos caramelos, claro.
Vista parcial da praça sobre a qual versa esta história.
Nesta zona, desde a praça até à igreja era tudo casas antes das invasões. Essa memória perdeu-se embora haja gente dada à arqueologia que já mo reportou.
O homem da Cruz que anunciava a passagem da procissão do Sagrado Coração de Jesus, tradição do mês de Junho que deixámos cair, terá pensado na sua queda sempre que pisava aquelas pedras e seguia ladeado das tochas vivas. Havia um dia no ano, pelo menos, em que ele se destacava, carregando o escândalo da Cruz – no dizer de Paulo. Todos já caímos do muro com Adão.
José Luz
(Constância)
PS- não uso o dito AOLP. Qualquer semelhança da personagem com a realidade é pura ficção.
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