Grupo dos anos 80 da vila, constituído por pessoal do Grupo Orfeónico Estrela Verde e do grupo cénico.
Quem ainda se recorda dos tradicionais candeeiros à moda antiga da Vila de Constância, substituídos nos primeiros mandatos da gestão de António Mendes? Na altura os modelos colocados procuravam imitar os antigos, e ainda aí estão, compondo a paisagem do burgo e emprestando-lhe uma tonalidade amarelada, romântica. Tal coloração sempre é mais acolhedora e contrasta com as novas lâmpadas brancas, directas, vindo de baixo ou de cima, potencialmente agressivas para a vista de quem tem olhos claros. Hoje em dia, parece, recomendam-se lâmpadas LED para projectos de iluminação pública de espaços ajardinados, por razões de economia, duração, e de não aquecimento das plantas e mesmo de segurança. São contextos distintos. Mas o objecto deste artigo é sensivelmente divergente dessa polémica. Aqui, visa-.se apenas um olhar e um registo da paisagem em que sobrevivem elementos do passado ou os seus protótipos modernos. É um olhar de leigo, informal, que procura perceber até onde vai a defesa e a preservação da paisagem urbana, no que tange aos seus elementos característicos. Procura-se ao mesmo tempo lançar uma sinopse sobre a instalação eléctrica em Constância.
Quem se passeia pelas ruas típicas de Constância pode ainda encontrar – ainda pode - esses nostálgicos candeeiros, presos nas fachadas e nas esquinas dos edifícios. Há candeeiros de rua antigos que são considerados verdadeiras peças de arte urbana. Falamos pois de, património.
Mário Mendes Lopes, antigo presidente da edilidade, um apaixonado pelo cinema e cultor desta arte, deixou-nos algumas imagens notáveis da vila de Constância num filme editado em 1938 mas que conterá filmagens desde 1924 a julgar pela descrição recente que a CMC divulgou. Nesta película, legada a Manuela de Azevedo e depois cedida à Associação da Casa Memória de Camões em Constância, surge no final uma imagem da vila nocturna, bucólica, única, com os candeeiros acesos. A serem imagens de 1924, então, os candeeiros ainda eram a petróleo. Em atalho de foice posso asseverar que a escritora e jornalista Manuela de Azevedo, fundadora da então independente Associação da Casa Memória, de Camões (com outra designação) me disse que foi ela que no tempo ainda do Estado Novo pediu a colaboração do Ministério da Guerra para se recuperar a película original do filme. Assim, esta versão que a CMC recuperou agora. por minha sugestão, é uma terceira edição.
Como curiosidade encontrámos no Arquivo Municipal de Constância duas informações: uma, sobre o registo dos contratos celebrados entre a Câmara Municipal e entidades várias, durante o período compreendido entre 22-11-1891 e 13-12-1893, nomeadamente, um auto de fornecimento de 25 candeeiros para iluminação pública, outra, dando-nos notícia de um auto de arrematação do fornecimento do petróleo para a iluminação pública da vila durante o futuro ano de 1913.
O Concelho de Constância aparece-nos apenas em 1933, a saber, no quadro dos concelhos com rede eléctrica inaugurada (em Abrantes a inauguração ocorreu em 1909) segunda uma tese de doutoramento de João Figueira sobre o Estado na Electrificação Portuguesa (1945-76), publicada há nove anos atrás. Recuando no tempo alguns anos, sabemos por este mesmo estudo que em 1928 a Hidroeléctrica do Alto-Alentejo (sociedade anónima de responsabilidade limitada) passou a apostar na hidroelectricidade de uma região mais desfavorecida que incluía o concelho de Constância e outros do nosso distrito. De facto, no quadro de electrificação do pais, balanço de Dezembro de 1926 (o mesmo estudo anterior) o concelho de Constância aparece-nos sem rede eléctrica. Em 1939 a Hidroeléctrica do Alto Alentejo explorava já o Concelho de Constância.
É um 1945 que surge finalmente a criação da Hidroeléctrica do Zêzere, cabendo-lhe numa primeira fase a realização do projecto hidroeléctrico mais emblemático deste período, a barragem e central de Castelo de Bode.
Segundo a tese que seguimos de perto, esta empresa viria apenas a realizar três aproveitamentos hidroeléctricos no rio Zêzere, Bouçã, Cabril e Castelo de Bode, que inaugurou entre Janeiro de 1951 e Outubro de 1955. Em Fevereiro de 1954, o outro aproveitamento que também fazia parte da concessão que lhe tinha sido atribuída em Dezembro de 1945, o aproveitamento de Constância, no rio Zêzere, foi suspenso devido ao seu reduzido interesse económico ficando, no entanto, essa decisão para reavaliação posterior, adianta o autor.
Nem as câmaras municipais nem as Juntas de Freguesia dispunham de meios para a produção de energia. Assim, limitavam-se a proceder à exploração de minúsculas redes de distribuição com a energia que lhes era fornecida pelas grandes companhias eléctricas.
No caso da Junta de Freguesia de Montalvo, de acordo com a dissertação de João Figueira, apesar da rede eléctrica ter sido construída a expensas da Câmara Municipal de Constância, esta Junta solicitou que a sua gestão ficasse a seu cargo pedido que, esclarece, foi aceite, «tendo esta Junta explorado esta concessão desde 1935 até Abril de 1957, altura em que a Câmara Municipal resgatou a concessão», termina.
Na vila de Constância existia uma figura típica o «Zé Alho», pau para toda a obra camarária, que zelava pelos velhinhos candeeiros. Era uma figura estimada por todos e que ainda não saiu da memória de várias gerações.
Uma outra curiosidade. Em 1968 a tarifa do preço de venda de energia para usos domésticos (escudos/kWh) era de dois escudos, como nos revela João Figueira citando como fonte a estatística das fontes eléctricas em Portugal.
Com a publicação de nova legislação em 1971, a Câmara de Constância veio a integrar a Federação de Municípios do Ribatejo em cuja composição participavam outras câmaras do distrito de Santarém, como Vila Nova da Barquinha, Golegã entre outras.
Esta integração nas redes eléctricas não foi feita de imediato no caso das câmaras de Constância, Mação, Sardoal e Vila Nova da Barquinha, obedecendo a uma plano faseado e gradual de três anos, debaixo da supervisão da Federação então constituída. Na opinião de João Figueira não era dada nenhuma explicação para esta situação. Segundo este autor «tal dever-se-ia às debilidades das redes de transporte de energia e de interligação com os restantes». A integração das redes eléctricas destes municípios na Federação foi assim realizada de forma gradual entre finais de 1971 e meados de 1977. Em Janeiro de 1972 integraram a Federação os municípios de Alpiarça, Cartaxo, Constância e Golegã. A rede eléctrica da vila de Constância era muito inconstante. Sempre que fazia mau tempo a luz faltava, levando os piquetes várias horas para resolver os problemas. Lá vinha o Mário, o Fernando, o Chico, o José Jorge, sempre prontos e operacionais. A EDP tinha uma oficina no Bairro Novo. Recordo-me bem de na minha infância faltar a luz na rua e em casa, com frequência. Valiam-nos os velhinhos candeeiros a petróleo. A vila tinha várias fases na rede. E ficava mesmo às escuras com frequência. Qualquer coisa, dizia-se logo, «foi na cabine». E não era, claro.
Na edição de 1 de Maio de 1971 do jornal «Nova Aliança, Joaquim dos Mártires Neto Coimbra, cronista de Constância e meu antigo mestre dá-nos a seguinte notícia: «Foi inaugurada no Sábado de Aleluia a luz eléctrica não só na freguesia de Santa Margarida da Coutada, como no Lugar de Santo António, pertencente à freguesia e Vila de Constância». Na mesma notícia J. Coimbra refere que este melhoramento doi iniciado por Júlio Feijão, anotando que a sua conclusão se deveu, passo a citar, «ao dinamismo do actual presidente da Câmara Municipal, sr Aurélio Dias Nogueira».
Em virtude da desastrosa participação na Grande Guerra, a partir de 1914 assistiu-se a um relativo abrandamento da instalação das redes eléctricas. O autor do estudo que vimos citando aponta dificuldades no acesso aos equipamentos e aos técnicos os quais, sublinha, «na maior parte dos casos, eram dos países beligerantes». A título de curiosidade refere ainda que algumas instalações conseguiram ser concluídas “à justa”, dando o exemplo do caso de Fafe, rede inaugurada em Outubro de 1914, «por os técnicos alemães envolvidos neste empreendimento terem regressado à Alemanha para serem incorporados nos exércitos». Noutros casos os projectos foram mesmo adiados por vários anos, como em Bragança etc. O que as guerras fazem à humanidade dos homens…
Fazendo a síntese, João Figueira. Conclui: «Passado o período da Guerra e os difíceis anos que se lhe seguiram, assistiu-se a uma forte aceleração deste processo nos anos 1920 atingindo-se no final deste período os 116 municípios com redes eléctricas instaladas», ou seja, remata, «mais 88 novas redes eléctricas instaladas, a par da ampliação das redes já existentes em alguns concelhos».
José Luz (Constância)
PS - não uso o dito AOLP
Histórias de vida no feminino” é o título da iniciativa com a qual o Museu dos Rios e das Artes Marítimas de Constância. vai assinalar o Dia Internacional da Mulher. A actividade é dinamizada online. De acordo com o noticiado «Na história da nossa vida todos temos, pelo menos, uma mulher que pela sua atitude corajosa, generosa e resiliente ou pela sua criatividade ou habilidade, foi notável aos nossos olhos…».. Com o intuito de perpetuar a história dessas mulheres que nos marcaram ou marcam, o Museu lança o repto aos participantes que queiram enviar textos e fotos para defesa das memórias colectivas os quais depois divulgará. Quando na edição anterior do grupo das redes sociais «Amigos de Constância», creio que em 2011 ou 2012, referi um caso de uma mulher de Constância que começou a trabalhar desde muito cedo, a acartar barrotes do “rio” e que fazia as redes de pesca , o então presidente quis logo saber quem era para se fazer uma espécie de retrato sobre essas memórias. Até hoje a mulher do «rio» que nos anos 40 fazia trabalho de homem, ainda não foi contactada. Por acaso a pessoa que atrás refiro é uma das mulheres que chegou a integrar o Núcleo de Constância do MDM no início dos anos 90. E, já agora, era uma simpatizante activa do MDP/CDE. mesmo antes da Revolução de Abril e sempre se manteve fiel a esse ideário, até à sua dissolução. Com ela assisti às sessões políticas durante a Revolução e no PREC no antigo cine-teatro, quando no calor dessas assembleias se faziam acusações de «vira-casacas».
Com ela cheguei a ir ao posto antigo da GNR várias vezes, por causa dos PIDES que em 1974 andavam fugidos por aqui e eram objecto de mandado. Recordo-me pelo menos de dois casos em que esses agentes se refugiaram na zona norte da EN nº3 da vila,, pela calada da noite. Sabia-se dessas movimentações na zona e o perfil dos ditos não enganava. Com o meu pai muitas vezes de prevenção nos quartéis, chegado da guerra de África, vivíamos as contingências duma iminente guerra civil. Como isso marca uma criança! Estávamos colados ao antigo rádio, procurando os postos que mais ousadamente furavam o regime ou, depois, a «situação». Com ela assisti no cimo da encosta do Zêzere, aos vôos rasantes nos Pára-quedistas em 1975 quando pouca gente ousava sair de casa. Uma história de vida que passa pelo «rio» a acartar barrotes que vinham a flutuar nas águas e que depois eram transportados para as camionetas. Ganhava 12 escudos por dia e trabalhava para os empreiteiros dos Vieiras e dos Cruzes. Ganhava como as mulheres maiores de idade.
O peso e a violência da tarefa, que os homens ali exerciam, era também o seu carma. Andou pelo campo na apanha da azeitona, esteve em serviço de casas no Algarve, de parentes da família Duarte Ferreira, em Alpiarça, numa Quinta famosa, Dom João, que recebia o Presidente da República ao fim de semana, na Golegã, na casa de um médico conhecido, eu sei lá. Uma história de vida que começou em Abrantes e em Lisboa, em casa da tia e da avó que a criou, e que passou por Viseu, depois, já com os pais e irmãos, várias vezes, até chegar a Constância em 1937. O pai era militar e foi mobilizado várias vezes o que implicava levar a família às costas. Uma história de vida que passou depois por Tancos militar onde foi a primeira funcionária a coser pára-quedas em Portugal. O machismo de Kaulza de Arriaga viria a reservar aos homens o monopólio dos pára-quedas. E os empregos na área foram extintos para as mulheres. Anos de serviço perdidos. Memórias de quem ainda tem a memória de ter sido vítima de um crime atroz em Viseu, de uma tentativa de rapto, a caminho da Quinta do Viriato. E tantas vivências que fazem da vida desta mulher uma película agridoce que só me orgulha do ventre de onde saí. O então presidente da CMC que desistiu rápido de perseguir o seu retrato, perdeu a oportunidade de um retrato de vida. Outros haverá e que agora esta iniciativa da edilidade de procurar retratos de vida de mulheres anónimas, os ajude a recuperar para memória de todos aquilo que ontem rejeitaram.
Desde a participação nos teatros, nas revistas, nas operetas, no rancho, nos cortejos de oferendas, quer como membro quer como filha de um dos principais organizadores, trabalhava no duro para a comunidade constanciense e era ainda em casa o braço forte duma família numerosa. Sempre lutou e labutou pelo amor da sua vida, «contra tudo e contra todos» como se fiz na gíria.. E fugia de bicicleta para ir ao seu encontro nesses tempos autoritários de namoro à janela a lembrar os tempos medievais. Mas não! Esta mulher não aceitava a tradição pouco consentânea com a dignidade das mulheres. É uma história linda de amor A dessa mulher e do seu marido o qual dentro de dias, faria 90 anos. É a história da mulher que a câmara chegou a querer retratar antes de saber o nome. Sabia parte da história. Mas não sabia o nome. E quando o soube, já não queria saber…
É também uma história de sofrimento e de luta heróica contra a maldita doença, há duas décadas. É um testemunho de resistência como nunca vi. Faço parte dessa história. Estou dentro da história. É a história da menina que um dia destravou o carro de praça do tio, o «Fonaca» de Abrantes, o padrinho, Chauffeur, fazendo-o entrar pelo Chave d’Ouro adentro na Barão da Batalha, ali, paredes meias na rua onde nasceu, das Flores. A menina que nos anos 30 calcorreava as ruas de Lisboa, descendo pela Luciano Cordeiro até perder de vista a sua tia artista que tocava piano e era corista. A menina que espreitava da varanda no Largo da Anunciada e que viu no Coliseu a estreia de «Jesus Cristo». Meu Deus, há quantos anos foi isso. A menina que ia de comboio de Abrantes para Lisboa com a avó a quem o regime sequestrou o marido para as colónias. A avó, a peixeira de Abrantes com quem percorria a Rua da sardinha. Esta também era uma heroína que ficou com uma data de filhos para criar. Histórias de vida de uma mulher anónima no feminino. Para celebrar o dia internacional das mulheres..
José Luz (Constância)
PS – não uso o dito AOLP
Com as últimas conquistas no território algarvio em 1253 e a consequente estabilização política do país, o rio Tejo assumia, enquanto eixo de comunicações, uma importância crescente. Este facto acentuou-se pela circunstância de Lisboa se ter tornado a capital do Reino e a sua principal potência económica. Dom Dinis ao promover as obras do Tejo e o seu sistema adjuvante, fundou Salvaterra de Magos e Muge, incrementando de alguma forma as navegações fluviais, facto a que não deixará de ser alheio o surto da capital lisbonense (1).
Dos portos do médio Tejo, Santarém, Abrantes e Punhete (2) eram sem dúvida os mais importantes. O sal, o peixe (seco, salgado, fumado ou fresco) e os panos, além de outros produtos de uso menos frequente, eram as mercadorias que subiam o Tejo desde Lisboa até aqueles portos. Para a capital transportavam-se madeiras, azeite, vinho, coiros, mel, cera, ferro e mesmo peixe do rio (sável, azevias, lampreias) (3).
No ano de 1552, de 1490 barcos de navegação fluvial que existiam em Lisboa e nos restantes portos do Tejo, 180 pertenciam a Abrantes (100 eram de carreira e 80 andavam na pesca), 100 a Tancos, 120 a Punhete, Asseiceira e Carvoeira e 100 a Santarém, que constituíam os principais portos do Tejo (4).
Os produtos transportados seriam sensivelmente os mesmos do século anterior com uma novidade: a grande quantidade de melões provenientes das lezírias de Santarém e de Abrantes (5). O vinho que chegava a Lisboa por via fluvial, pelo que se depreende do «Pranto de Maria Parda», deveria ter muita importância e tomava o nome dos portos de embarque Santarém: Abrantes e Punhete (6).
A raiz de todo o desenvolvimento de Punhete esteve sempre, estou ciente, na sua privilegiada posição estratégica. Sabe-se, foi objecto de abundante legislação régia, sendo de referir que por alvará de D. Pedro I, Punhete era ponto obrigatório de embarque de todas as mercadorias daquela zona que se destinassem a Lisboa (7).
Abundante legislação se pode encontrar em seu favor, e mesmo contra. Por exemplo, numa carta do rei D. Pedro I, dada em 13 de Abril de 1358 (era de 1396), o monarca, considerando que a vila de Santarém, «he huu dos boons e dos mjlhoores lugares do meu senhorio», e estava despovoada de «companhas» e de mais coisas necessárias para o serviço régio, resolve atalhar a essas carências. O lugar de Punhete era um porto activo, o que causava prejuízo ao crescimento populacional de Santarém. Por tal motivo o rei ordenava: 1) «que nenhuas barca nom pasem de santarem pera cima com nenhuas mercadorias saluo com panos e com al que comprir pera mantijmento daqueles que esse mantijmento leuarem pera ssy ou pera outrem» (8)
Num documento encontrado na Chancelaria de D. João I tem-se notícia da atenção da Dinastia de Avis dispensada a Punhete, então Lugar. Veríssimo Serrão dá-nos a conhecer uma carta do monarca, dada a 23 de Agosto de 1390 a Afonso Pires, Juiz em Abrantes: «…Sabede que os homes boons e poboradores de punhett nos enviaron dizer antigamente que a memoria dos homes non era em contrario per seus privilégios e seu foral que lhes foi dado… pelos rex os que antes nos foram E outrosy per nos atee o tempo dora ouveram seus juízes e jurdiçam no dicto loguo de todollos feitos crimes…»(9).
Num relatório do espião castelhano Rui Dias de Vega ao rei Dom Fernando I de Aragão em 1415, este faz saber a Castela dos preparativos que em Portugal se faziam para–aconquista de Ceuta»: «(—) El Prior et los maestres mandan fazer sendas geleotas de sessenta rremos cada uma, salvo el maestre de Santyago. Et fazenlas en el ryo de Sesar, que es cerca de Punhete, et entra en Tajo aquel rio a syete leguas de Santarem (…)». (10)
Punhete, no início do século XVI, a recordar tempos passados, mantinha-se próspera, e continuava a atrair a atenção régia. Em Outubro de 1505, aquando da deslocação de D. Manuel I, de Lisboa para Almeirim, por motivos da peste, parte da sua comitiva instalou-se ali; mais concretamente, a 12 de Maio de 1507, quando se assentou a cisa dos vinhos de Lisboa, a corte encontrava-se em Punhete (11).
No ano de 1571, Dom Sebastião concede a Punhete «que seja vila», declarando-se no respectivo documento que no dito lugar já havia «casa e audiencia da camara e cadea e pelourinho com suas argolas e cepo e açougue» (12).
A Casa dos Sandes, senhores e alcaides do burgo e donos de quase todo o comércio no século XVI, crescera e atingira um desenvolvimento tal que, em 1620, o filho de D. João, o Doutor Francisco de Sande, já instituía, «com cabeça na sua casa da Torre e da Amoreira», o morgado de Punhete. (13)
José Luz
(Constância)
Publica-se uma evocação nostálgica do comércio perdido da vila de Constância, do amigo Zé Luz:
Lembram-se? Dos cartuchos? Do papel pardo (desperdício da velha reciclagem)? Eram usados nas mercearias da vila de Constância e um pouco por todo o lado. Na vila, podiam ser encontrados no «João Costa», na «Mari Lopes», na «Marineta», no «Zé Rebimbas», no Sr Raimundo, na Drogaria do Sr Aurélio e, depois de usados, fazíamos “gatos” na escola com eles, consumidas as especiarias que os mesmos acondicionavam.
Nas compras, gostava de sentir o cheiro do colorau, da pimenta, da canela, da erva doce, eu sei lá. Era uma verdadeira miscelânea dos sabores que emanava dos armários da Mari Lopes, ali, a meio da Rua de São Pedro, junto à casa do O’ Neill. Eu gostava das texturas e adorava «sentir o som» do papel vegetal com que se embrulhava a marmelada.. Açúcar ao peso, era ao peso. Agora… já não há aromas. Vem tudo embalado, selado, cerrado, escondido, aprazado e legalizado. Pronto! Estamos integrados na União. E o sabão? Aquelas barras imensas azuis e cor-de-rosa que eram cortadas na lâmina, na medida que se pedia e queria. «Quem está a seguir, por favor?!», apelava a minha prima Lurdes, funcionária exemplar da loja do «João Costa» (lá em casa assim se continuava a chamar a loja do primo . O pai dele, foi um dia ao Coliseu ver a revista «O fim do Mundo» e… morreu de ataque cardíaco, não sei bem se em 1934). Os clientes eram tratados com gentileza, com fineza, em todas as lojas do burgo. Sempre. Sim!, a vila era habitada na maioria das casas. Vivia-se a «Primavera marcelista» e depois. despontava a Revolução. Essa foi a minha infância. Uma infância em que o meu pai andava na guerra além mar. Mas o açúcar – as crianças adoram açúcar – era mascavado e amarelo. As sombrinhas da Dona Beatriz, ali dependuradas na montra verde da papelaria. Os armários de parede da Mari Lopes, aqueles armários com gaveta aberta e folgada em baixo, eram um mimo. Aquele sobrado, um espelho. O atendimento, esmerado. Até o timbre da voz da Mari Lopes era o adequado para a função (a voz é o retrato da pessoa, da sua alma) Era assim na vila. Descia-se o Arco e, lá em baixo, quase defronte da antiga mercearia do século XVIII , entrava-se na loja do «Zé Rebimdas e da mulher a Dona Mariana. O trato antigo que dispensavam e a conta no papel pardo com a prova dos nove, o «deve e haver» cheio de páginas… esse ambiente, essa «película do tempo parado». Anteriormente havia ali, paredes meias, a loja do Zé Baptista e da mulher, a Dona Elisa, dos célebres queijinhos do céu. Mais tarde foi pronto-a-vestir. Ah! E havia a fabrica das camisas. E a Dona Teresa do «Cação»? Onde mais tarde morou o escritor Baptista Bastos, pegado com a casa onde no despontar do século tinha nascido o grande Poeta Tomaz Vieira da Cruz – olvidado localmente pela estupidez e ignorância dos homens e da inveja que sempre acompanhou os patrícios de toda a terra. Maldito pecado de Caim. O bacalhau do Natal da Dona Teresa era uma obrigação. Que maravilha!« Embrulhado à antiga». «Vai lá à Marineta!» (a Maria Neto tinha sido a sogra da Dona Teresa, com loja no Olival, e o nome ficou na memória dos locais). Natal! O presépio da Dona Teresa, minha primeira catequista, era um primor. As suas figuras de barro faziam o encanto das crianças que por lá passavam várias vezes ao dia. Os caminhos eram feitos com farinha (lá em casa também era assim). A cabana do Menino Jesus, um encanto. No «Santos Costa» («Vai lá abaixo ao João Costa!» dizia a minha mãe), era um mundo de gente de todo o lado. Ia lá também ao petróleo, num piso inferior (o meu primo João Costa, filho do fundador, Manoel, tinha sido o empresário das antigas bombas onde havia um depósito de água que a minha avó Flora (sobrinha do fundador da grande empresa) enchia com cântaros, num eterno e pesado labor, mal pago. Ficou essa memória para herança. Na loja, passava pelo escritório dos meus primos Galiano e Angelina, onde se faziam as “letras” e todos os contratos da grande indústria secular das redes de pesca. Vinha gente do Minho encomendar as alvitanas, as narsas, os tresmalhos, Também fiz muitas alvitanas em criança. Aquele escritório… ficou-me gravado o «som do seu silêncio». Os meus primos… falava um de cada vez. Com uma fluência e cadência coordenadas. Recebiam-nos (a minha e à minha mãe). Primeiro tocávamos uma campainha no rés-de-chão e a ordem era logo para subir. A loja era um verdadeiro «centro de comércio». A mercearia, as roupas do pronto-a-vestir, o armeiro (vinha gente de todo o país comprar armas), a secção baixa das loiças, quanta oferta no «Santos Costa» – o «João Costa» -, passo o quase pleonasmo. Até a velha cadeia onde metiam os caixões. E quando a cheia ameaçava a loja, os seus funcionários accionavam um plano de emergência caseiro, habituados àquela rotina. Há registos das cheias desde pelo menos o tempo de Camões. É ver a «Miscelânia». Camões teria estado preso na Torre, da Ordem, rodeado de água, esse cenário é potencial! Alguns investigadores do século XIX não viram o filme todo… À indústria das redes aderiu a Drogaria (mercearia, drogaria, papelaria). A vila oferecia um quadro pitoresco aos visitantes, desde a Olaria ao Olival. Era ver as mulheres da vila sentadas à soleira da porta. No Olival, a Dona Olívia ensinou gerações, diziam-me. Ainda vi durante vários anos, as artesãs Zulmira, a Jaquina da Ana Bogas, a Maria Morais, a mulher do «Cacilhas», a Isabel da condução, a Luci Barreiro, a minha mãe, a Dona Adelaide do «Santos» taxista, a Mari Lena, a Manuela do Alfredo, tanta gente nessa indústria. Falava-se que o mestre das redes tinha sido o «Tonho Casca» que foi e veio da Grande Guerra . O nylon (dantes era algodão) cortava-nos os dedos, pois os nós das malhas tinham de ser firmes. Quanto maior a malha, maior a dor produzida, dada a frequência dos movimentos dos dedos. Recordo-me de um dia ter feito carreiras para uma cabeça de 750 malhas. Ainda tenho as agulhas e as palhetas da malhas.
Normalmente as alvitanas eram de 12 vinténs, 250 malhas e doze carreiras. Aos pares e entrançadas. Voltando à loja… as enormes peças de fazenda, as montras. A vila do meu tempo de criança e de juventude. Constância era assim! Vista Por Dentro! As tabernas, da Conceição Coimbra, do meu primo Mário Barbisco, da Mari Dona – o cheiro do peixe e das favas fritas era um chamaril na praça. A barraca do Cuchinho, de canas, junto ao Tejo. A praça, de semana. E ao Domingo? Cheia de gente. Levantava-me cedíssimo pois às sete de matina os suspiros e as ferraduras já quase se esgotavam. E os vendedores ambulantes? Vinham de Martinchel, das Limeiras, de Montalvo, das Amoreiras, eu sei lá. A nossa vila era tão diferente. Está pior! Ah! E havia a loja do primo Raimundo com os amendoins e o aniz. Havia comércio. A loja do João Pereira , que montava as antenas e vendia televisões. O saudoso Ercílio que tudo resolvia. A Dona Elvira, com a sua paciência para dar conta de tanta variedade de produtos. O Talho da Salcheiro na praça, o do Manel do Café, o do casal dos porcos construído junto às ruínas da antiga praça de toiros de que há registo escrito no século XIX. E o restaurante da Arroçada- sA padaria da dona Luísa. Ah! A padeira ambulante que vinha duas vezes por semana do Alentejo. O pão, de quatro canto, vinha quentinho. Qu delícia logo que barrado da geleia, ou do doce de tomate, ou do doce de pedaços de marmelo. Tudo acompanhado com uma grande caneca de café. Bem composto no estômago lá voltava às minhas recolhas das antigas tradições, de porta a porta. Guardo zelosamente esses cadernos. O café da Ponte, perto da antiga «taberna» das velhas Burguetes, tias das velhas Burguetes que conheci,, o café do bairro dos bailes tradicionais onde a minha família foi ver a ida do homem à lua (bebé incluído). O café «Estrela» na praça que nos anos 20 e 30 era a mercearia do Isidoro Burguete, pai do escritor Meira Burguete autor do «Caso de Rio Maior», da família do escritor Elviro da Rocha Gomes. O Clube Estrela Verde, tão concorrido à noite para as cartas, para o orfeão, para o teatro, para a biblioteca, para o ping pong, para o bilhar, para a sala da televisão, para o bar. A Casa da Sopa, com as aulas de música do padre João, com o pingo pong (onde havia antigamente a Associação de São José. As lojas do Salgueiro, com muitas novidades. As barbearias do «Cação» e do Lino. E a Nanda cabeleileira. A Mimi cabeleileira. A dona Beatriz Gouveia cabeleileira.. As vendedoras de ovos., de galinhas e de coelhos. A Mari do Peixe do Cagaréu, gente muito honesta, trabalhadora e humilde. A taberna da Ti Cesaltina, onde ia ao carvão. A Júlia do Sapateiro que tinha também pronto-a-vestir. A oficina dos mecânicos na João Chagas onde o Elias tinha em tempos o armazém, ao lado do velho e desaparecido «Sport Club Strêla Verde». O fotográfo na Luís de Camões defronte da antiga câmara. Na farmácia, o Godinho (que não passava sem a sua aguardente purificadora) e o sr Henrique da farmácia, irmão do poeta Tomaz. O relojoeiro Ramos. A oficina do Zé David que em tempos recuados teria sido um celeito. E os antigos celeiros do Dr Godinho. Os tendeiros. A venda de arraiolos, particular.
Paz à alma da Dona Etelvina, a grande mestre na vila dessa arte difícil só para alguns, do ponto dois e três. As mulheres que faziam colchas de renda e não só. Saudades da vila de Constância. de uma vila feita de famílias conhecidas e de parentes. Saudades de gente que se respeitava. Saudades das idas à quinta de Santa Bárbara ao lagar, na minha bicicleta, apeado, pelos antigos caminhos, transportando no velocípede as saca sde azeitonas. Na quinta, havia venda farta de fruta variada, a saber, ameixas, pêros (não são maçãs), e outras maravilhas. Saudades da apanha da azeitona. De ver lavar no «rio». De ver vender o peixe à porta, de ver vender os queijos que, depois se secavam e punham «de azeite». Saudades de ouvir esses quase pregões: «Teeenho fataaaça!», «Teeenho «boooga». Saudades de ver esses fogareiros pela vila a ser acesos para a grelha do peixe. Saudades das noites de convívio no Clube, no cine-teatro histórico (que substituíram pelo mamarracho inútil). Saudades dos ensaios permanentes, do rancho, do teatro, do orfeão eu sei lá, Saudades da Constância que perdemos! Saudades de tantas marchas populares.
Memória de ouvir falar da carvoaria defronte da Casa da Dona Adelaide Sommer, da loja da Nazaré nas escadas da São Pedro, do forno da Paralva, na Rua de São Pedro confinada com o Avelar Machado, das duas casas comerciais da Etelvina Gil, na praça, da taberna do primo Eduardo e do Talho do Leitão de Abrantes, da loja da Sara, da Pensão da Rebolas (Pensão Central), da Pensão da Jaquina Ferreira, pensão Ribatejo, (a sobrinha que me disse que levava as refeições à cabeça para a base, para os militares.) Memória ainda de tantas e memórias sem fim…
José Luz (Constância)
PS – não uso o dito AOLP. este texto é telegráfico. Assim deve ser lido…
Grupo dos anos 80 da vila, constituído por pessoal do Grupo Orfeónico Estrela Verde e do grupo cénico.
Fresco inédito da NatividadeO fresco foi descoberto em Constância nos anos 90,por ocasião de um restauro.
Uma pintura com a estrela de Belém da natividade e os contornos de uma estalagem? Parece, A estrela de vergina como inspiração? Talvez.A descoberta ocorreu por ocasião da substituição de uma tela do altar da Senhora da Piedade Após ter sido fotografado o fresco terá sido objecto de intervenção por... trabalhos de trolha.Será que ainda vamos a tempo de alguma recuperação?É deveras singular a circunstância de ter existido em Constância uma estrela de vergina. Sabe-se que a sua utilização até aos anos 70 do século XX se resumia a elementos decorativos. Ora, este ícone religioso em Constância, aparenta ser mais do que isso. Um símbolo religioso? Da Virgem Maria? O Sol (Jesus)? O fresco será da Natividade? Há que estudar o assunto. E inserir este tema na história da nossa igreja. A cristianização de um símbolo da realeza macedónica?A estrela andara associada, no cristianismo, à Virgem María.A nossa fonte informou-nos existir reporte no Instituto José Figueiredo, nomeadamente, da descoberta e intervenção posterior.Sabe-se que até ao início do século XX existia na vila uma tradição directamente ligada à Natividade: a do Menino Jesus. Todos os anos o Menino era entregue a uma família onde eram confeccionadas vestes bordadas a ouro. E a imagem ia passando de casa em casa. A última festa foi em grande. Dela tive conhecimento pela filha do anfitrião, no caso a minha prima Maria do Céu Pirão. O seu pai, António Pirão, curiosamente, era ateu.
José Luz
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