Joana Lopes, Entre as Brumas da Memória. Os católicos portugueses e a ditadura, Âmbar, Porto, 2007, 248 p, pp. 229-230.
As assinaturas foram divulgadas mais tarde, em 17/4/2007, no blogue Entre as brumas da memória.
«Exº e Revº Senhor,
Consta com um certo grau de publicidade que Sua Eminência o Senhor Cardeal Patriarca apresentou ao Santo Padre o pedido de exoneração do governo da diocese de Lisboa. Não sabemos por quanto tempo o S. Padre manterá a negativa que deu ao pedido do Senhor Cardeal Patriarca. A sua idade faz nos pensar que, segundo o caminho ordinário da Providência, não será por muitos anos que poderemos gozar da alegria de o ter como pastor.
Membros do Povo de Deus, colaboradores do ministério episcopal, integrados no presbitério diocesano, sentimo nos no dever de colaborar com aqueles que finalmente irão decidir sobre quem há de presidir, no futuro, ao povo cristão da diocese de Lisboa. Este nosso passo significa objectivamente – assim o julgamos – maior amor à Igreja que uma aceitação passiva dum qualquer bispo que nos fosse dado. Temos consciência de que é exigência da nossa condição de membros activos do povo de Deus, sempre atento a perscrutar os múltiplos sinais da vontade do Senhor, e especialmente neste caso em que está em causa o sinal ministerial da Sua pessoa; cremos que a colaboração, que define o nosso sacerdócio, deve estender se também à escolha daquele de quem vamos ser colaboradores, em ordem a uma sempre mais leal e generosa cooperação.
Ninguém ignora que a diocese de Lisboa é, hoje, em Portugal, a diocese que exige maior lucidez para equacionar os problemas pastorais, maior coragem nas soluções e maior rapidez de acção. Em Lisboa sente se, como em nenhuma outra parte do país, a urgência de redimensionar toda a pastoral em função dum mundo que tão rápida e profundamente se transformou. Cremos que não é útil à diocese, neste momento, um bispo notável apenas por reconhecida e elevada cultura, suficiente talvez noutro contexto em que os problemas pastorais fossem de menor importância; não é o momento para um bispo que seja apenas o fiel guarda dos bens materiais adquiridos e das soluções pastorais encontradas pelos seus antecessores. Pensamos que a gravidade do momento não permite considerar a Sé de Lisboa como a mais elevada recompensa pelos serviços prestadas à Igreja. Impõe se um bispo que seja essencialmente pastor.
Parece nos que o Senhor D. Manuel Falcão, Bispo de Telepte e actual auxiliar do Patriarcado, pela sua capacidade de acção, juventude e reconhecida competência pastoral, poderia ser o bispo de que necessita a diocese de Lisboa. O Senhor D. Manuel Falcão foi, durante uma dezena de anos, professor no Seminário Maior dos Olivais, o que muito contribuiu para a sua formação sócio pastoral e para a geral simpatia e conhecimento pessoal e directo do clero; os seus estudos de sociologia religiosa dotaram no com um precioso instrumento de observação da realidade pastoral e fizeram no um dos melhores conhecedores do estado actual da diocese; a direcção do Boletim de Informação Pastoral fê lo debruçar se sobre os principais problemas da pastoral moderna; tem estado na origem de todas as iniciativas pastorais de vulto da diocese nestes últimos anos, por reconhecida competência e com o aplauso unânime do clero.
Mais nos convence da oportunidade da sua escolha a isenção política que tem mostrado, num momento em que muitos cristãos e alguns dos sectores mais vivos da sociedade portuguesa se interrogam angustiadamente sobre o compromisso da Igreja com o actual regime político.
Queira Vossa Excelência Reverendíssima, Senhor Núncio, receber a expressão sincera do nosso filial amor à Igreja e da nossa veneração ao Santo Padre.»
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Subscrevo a carta enviada ao Senhor Núncio Apostólico em Lisboa com data de 25 de Dezembro de 1967, sobre o futuro bispo.
(106 assinaturas)
104 padres (um dos quais Cónego) e dois Diáconos''