Foto Los Angeles Times/Sandy Driscoll com a devida vénia
O milionário Ernest Lieblich morreu em 2009. Era irmão da escritora alemã, naturalizada portuguesa, Ilse Losa. Chegou como refugiado judeu a Portugal em 1939. Esteve preso pela Pide, enquanto aguardava um visto americano para emigrar para os USA, coisa que conseguiria em 1941. Toda a sua história foi contada por Marcos Alves, na ''Sábado'', nº903, (Agosto 2021), que só agora me chegou às mãos e para a qual remetemos.
Para o caso abrantino, M. Alves relata a intervenção pessoal de Manuel Rodrigues, ao tempo M. da Justiça, que se dirige, por carta, ao seu ''Camarada e Amigo''', Mário Pais de Sousa, Ministro do Interior, familiarmente chegado a Salazar, apresentando Lieblich, interessando-se por ele e pedindo que MPS o protegesse. (1)
Apesar da prisão pidesca, o empresário ficou bom amigo de Portugal e uma colecção de arte sua, foi legada ao nosso país. Composta por quadros de autores modernos lusos.
Quando se teorizar sobre o anti-semitismo fascista, ter-se-á de dizer que havia um fascista abrantino, o Manuel Rodrigues, que protegia judeus.
mn
(1) Marcos Alves, ''Os Judeus perseguidos pela Pide'' na revista citada
O tipo que era Juiz de Fora, ou seja Presidente da Câmara , Gaspar Pereira da Silva e Navarro, natural da vila abrantina, provavelmente mentiu no processo. Sustentava que o requerente, outro Gaspar, Pessoa, era nobre e tinha ascendência relacionada com os Pessoa e Amorim de Coimbra. (1)
Outra testemunha, cá da zona, Joaquim Alexandre de Sousa Fragoso, ''fidalgo de S.Majestade, vigário colado de São Julião de Punhete,'' também disse que o judeu Gaspar tinha nobres costados (o que era rotundamente falso) e grossos cabedais (o que era verdade). (2)
Pretendia enobrecer o rico descendente duma família de cristãos-novos do Fundão (aparentado com os Bívares cá do burgo) e fazer esquecer um passado ainda até há pouco vergonhoso, passava pouco tempo que Pombal abolira as distinções entre gente de nação e pessoas com ''sangue limpo''.
Isto é o que consta nos autos de Justificação de nobreza do Gaspar Pessoa, que foi o homem que se encarregou da manutenção das pontes de Punhete e Abrantes, durante as invasões francesas e ao mesmo tempo tinha rendosos negócios com a tropa.
Também consta uma árvore genealógica provavelmente falsificada.
O divulgador Manuel Castelo Branco deixou-se enganar pela falsificação setecentista, ao estudar esta ascendência, num estudo de 2008, que a autora que seguimos, Gislaine Gonçalves Dias Pinto (''Perseguição, Nobilitação e Mácula de Sangue Cristão Novo, A trajectória da família Pessoa Tavares, (1706-1816)'') desmonta documentalmente.
O Gaspar seria enobrecido. Comendador de Cristo. Etc. Nada mau para um descendente de mercadores do Fundão, que ainda há pouco judaizavam.
O filho do Gaspar, também Gaspar, Pessoa Tavares de Amorim da Vargem, foi barão e Visconde da Vargem, Amorim sem o ser, Comendador de Nossa Senhora de Vila Viçosa e de Cristo, Coronel, Morgado e Vereador da Câmara de Lisboa. .....
A tese da doutora Gislaine é um magnífico contributo académico para o estudo da ascensão social da alta-burguesia no período pombalino.
Finalmente desta família Pessoa.......descende Fernando António Nogueira Pessoa, ''Príncipe da Nossa Baviera'' ( Eduardo Lourenço dixit).... que nunca teve entre os antepassados, nobres medievais, pelo lado Pessoa...., por mais que um Presidente da Câmara, natural de Abrantes, tenha ajudado a falsificar uma genealogia....
ma
(1) e (2) in Gislaine Gonçalves Dias Pinto , Perseguição, Nobilitação e Mácula de Sangue Cristão Novo, A trajectória da família Pessoa Tavares, (1706-1816 ),tese de doutoramento na U. de Minas Gerais, 2016
ma
O judeu abrantino, Miguel Francês (apelido duma prestigiada família marrana local) deve ter sido o mais prodigioso delator premiado, cá do burgo.
Residia em Pernambuco, em pleno século XVII, quando a cidade brasileira estava nas mãos dos holandeses e em geral a comunidade judia se aliou aos invasores calvinistas.
Colocando ao seu serviço as redes comerciais que dominavam, como o tráfico de escravos de Angola para as costas brasileiras.
Miguel Francês, comerciante afamado, permaneceu fiel aos interesses lusos e ao mesmo tempo delatou à Inquisição, os seus irmãos de fé.
Delatou 130, 33 residentes em Amsterdão, 57 em Hamburgo e 33 na colónia americana. (1)
Caçado num processo inquisitorial, foi bem tratado, transportado para Lisboa, e depois de se penitenciar, posto em liberdade e regressou a Pernambuco.
Ao contrário do habitual, os seus bens ficaram incólumes ao confisco inquisitorial.
Morreu como o homem mais rico lá da terra, no Recife.
Saíra de Portugal, rumo a Amesterdão, onde judaizara, fora baptizado como católico em Abrantes.
O Poder tratou sempre bem os delatores......
ma
(1) Bibliografia citada
(Bibliografia :Regina de Carvalho Ribeiro da Costa, ''Disjuntivas judaicas no contexto do Brasil Holandês, entre a Fé e o Interesse'' ,Revista Contraponto, Janeiro/Junho, 2020)
Faim Navarro, judeu de Abrantes, financia juntamente com muitos membros da comunidade judaica, a Guerra contra Castela, quando D.Afonso V pretende o trono do país vizinho, depois de casar-se com a Rainha Joana, a Excelente Senhora.
A contribuição do Navarro são 5 mil réis emprestados à Coroa..
Como se sabe, a guerra perdeu-se e Joana passou uma temporada aqui na cidade, sob os cuidados da família Almeida,antes de a meterem à força num convento.
ma
O abrantino Castanho já o vimos sair no Auto-de-Fé de 1637, em Vera Cruz (México). Mas além dos negócios de cacau, o judeu Duarte Castanho tinha outros negócios, que costumam ser típicos da ''gente da nação'', desta época, como foi o caso de Francisco de Sequeira, que arrematou os impostos abrantinos pelos mesmos tempos.
Duarte Castanho arrematou os impostos que deviam pagar os índios da zona de Vera Cruz e que as autoridades coloniais tinham dificuldade em cobrar.
Para garantir que as comunidades indígenas pagassem, que fez o Castanho?
Organizou uma milícia de pretos livres, armados, a ''mesnada'' para coagir os caciques e os nativos a pagar, sob pena de suportarem os machetes e os arcabuzes da leal milícia do usurário judeu. (1)
Não era só ele que tinha um exército particular, os outros arrematadores de impostos, faziam o mesmo. Não me admirava que se os índios actuais encontrarem uma estátua dalgum Castanho, que esta vá à vida.
(1) Antonio García de León, LA MALLA INCONCLUSA. VERACRUZ Y LOS CIRCUITOS COMERCIALES LUSITANOS EN LA PRIMERA MITAD DEL SIGLO XVII,Redes sociales e instituciones comerciales en el imperio español, siglos XVII a XIX. Instituto Mora/ Facultad de Economía UNAM. México, 2007: Pp. 41-83
Com o calor que está arrumar papéis é tarefa épica. Mas vai-se arrumando e haverá que colocar no arquivo informático, esta tese ''Cristãos-novos e seus descendentes no Ceará Grande: a inquisição nos sertões de fora'', do doutor Nilton Melo Almeida, defendida em 29 de Março de 2016, na UNL.
A tese tem grandes agradecimentos ao caríssimo amigo dr. António Graça Pereira, que foi anfitrião do investigador brasileiro, em Abrantes e ainda ao Sr.José de Oliveira Vieira, outro bastião da História abrantina e colega do indispensável '' Coisas de Abrantes''. Também há agradecimentos aos funcionários (simpáticos) do Arquivo Eduardo Campos.
Não param aqui os agradecimentos tubucianos, também se refere o autor ao Prof. Fernando Catroga, cujo prestígio além-Atlântico é notório, e que já não vemos desde o doutoramento do Jorge Santos Carvalho. .
A tese para o caso abrantino estuda a vida do judeu Francisco de Sequeira, morador na rua de Santo Amaro (tinha de ser).
A coisa mete amores, tentativa de homicídio porque o marrano pretendeu a mão de donzela ( esperemos que conservasse a donzelice, como diria o coronel Ramiro) uma tal Tomásia da Fonseca de Almeida e a família, que tinha ''sangue limpo'' não gostou do atrevimento . O assassinato foi organizado pelos Soares Galhardo, da governança da terra, um deles padre.
O Sequeira, como bom marrano, arrematou os impostos e isso causa-lhe (estamos por volta de 1630) a inimizade dos poderosos locais e não contente arranja duas amásias, ambas manas.
O resultado é que cai nas garras do Santo Ofício
Definido como o ''maioral dos judeus'' acha que o Senhor dos Passos,
é ''somente uma estaca'' da autoria do marceneiro Marcos Leal.
Não sabiam quem fez a imagem? Já sabemos....
As duas manas são putas e vivem em casa duma mulata, mas a Inquisição acha que são gente séria.
O Sequeira dorme com a cunhada, como lhe ensinou um padre preto do Mação, para cumprir a a Lei do Levirato. Isto é melhor que um romance de Jorge Amado....
Sai em auto de fé mas salva a vida. Volta a judaizar. Arderá numa fogueira.
Não vou continuar. Uma notabilíssima obra que nos permite saber o quotidiano dos judeus abrantinos em Seiscentos. Não se sabia quase nada.
ma
imagem da tese com a devida vénia
''Na gente da nação deste Bispado mandem Vossas Mercês ter especial vigilância e cuidado por amor de Deus, e tratem Vossas Mercês de pôr mais comissários e familiares nos lugares convenientes do Distrito, como o são a Guarda, Covilhã, Fundão, Idanha-a-Nova, Castelo Branco, Abrantes, e outras a que Vossas Mercê parecer, porque estas partes da Beira estão muito infeccionadas de judaísmo, em particular o Fundão e Idanha e Guarda ''
O Conselho Geral do Santo Ofício a D. Afonso Furtado de Mendonça, Bispo da Guarda, diocese de que fazíamos parte.
Citado por José Pedro Paiva, ''Baluartes da Fé, O enlace entre a Inquisição e os Bispos, 1536-1750''.
O autor destaca ainda o papel do Bispo-Conde de Coimbra, D.Jorge de Almeida na caça ao judeu.
O Prof. Paiva é um dos grandes especialistas de História da Igreja.
ma
Foi D.João de Portugal, Bispo da Guarda, diocese que abrangia a região abrantina.
Era D.João de nobre ascendência, com sangue dos Braganças e duma dinastia de Bispos.
O seu avô, D.Afonso de Portugal fora Arcebispo de Évora (1485-1552) e era descendente do 1º Duque de Bragança.
O seu pai era D.Francisco, que de bastardo do Arcebispo, passaria a Conde de Vimioso.
Mas contra ele estava um homem poderoso, o Cardeal D.Henrique, Inquisidor Geral e depois Rei, que suspeitava que D.João tinha relações perigosas.....nada mais nada menos que com a influente comunidade judia abrantina, que andava travestida em missas e rezas, na ortodoxia católica.
Por isso o Santo Ofício não confiava num amigo de hebreus.
E o futuro de D.João, como partidário do Prior do Crato, não seria brilhante...
José Pedro Paiva, Baluartes da Fé e da Disciplina, o enlace entre os Bispos e a Inquisição, 1536-1750, Unv.Coimbra,
mn
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