Como é que ''os fascistas'' achavam que se dizia no Prec, em francês, Correia Jesuíno?
Je Suíno........
Como respondeu a Correio Jesuíno quando o marujo quis restaurar a censura, Artur Portela Filho, Director do Jornal Novo?
fernando vasconcelos in página pessoal de a.p. f.
Respondeu assim:
DGI - Notícia 4 282, de 3/9/75 - Gabinete do Chefe do Estado Maior da Armada:
A Assembleia da Armada verificou que mais uma vez a Marinha foi tratada, nas páginas do Jornal Novo, de uma forma que se considera ofensiva do prestígio e dignidade da Armada.
Constatando que o facto apresenta características de difamação sistemática, constituindo um abuso da liberdade de Imprensa, a Assembleia avisa solenemente o Jornal Novo que a Armada se reserva o direito de actuar revolucionariamente, em justa defesa do seu prestígio, se casos de idêntica natureza se voltarem a repetir.
Marinha:
Porque é que os Gabinetes têm, do ridículo, esta decidida vocação?
E porque é que o Gabinete do Chefe do Estado Maior da Armada, que tem mais mar, e mais mundo, que tocou, do perfil da civilização, todos os portos, se sujeita a escrever esta coisa de que gerações inteiras rirão?
Dizer que uma fotomontagem que faz pedalar, na primeira página deste jornal, um comandante político, "ofende o prestígio e a dignidade da Armada ", dizer que uma fotomontagem, que coloca, sobre a obra-prima de humor, de sensibilidade, de garra portuguesa, que é um desenho de Rafael Bordalo Pinheiro, a cabeça de um Primeiro-Ministro, " apresenta características de difamação sistemática " - é a demonstração de que o Gabinete do Estado-maior da Armada tem capacidade de não ser, por vezes, excessivamente inteligente.
É a demonstração de que este Gabinete não compreende nada do que tem de ser essa qualidade, essa cultura, essa plasticidade, essa largueza, essa força da razão, essa intensidade humana, que é a política, que é a responsabilidade, não apenas de um convés, de um quartel, de um mar chão, mas de uma complexidade, de uma heterogeneidade, de uma dialéctica, que é - um País.
Se um Gabinete de Chefe do Estado-maior da Armada não entende que nem a fotomontagem onde pedalava um político responsável pela lei de Imprensa que nos queria amordaçar a todos, nem a fotomontagem em que Pinheiro de Azevedo tinha a honra de apor o seu rosto, que a História mal conhece, a um desenho, que a História de Arte e a História tout court consideram inesquecível, são ofensivas do prestígio da Armada, da dignidade da Armada, esse Gabinete, não somente não tem nenhum sentido de humor, como não tem robustez psicológica, endurance cultural, para assumir, deste País, deste País que sempre soube rir, desde o escárnio medieval ao Eça constitucional, os destinos.
É grave, Gabinete.
É grave, Armada.
Porque, dois pontos: nem nós temos, contra a Armada, nada de irredutivelmente sério, nem nenhuma revolução é incompatível com a alegria.
A Armada, Gabinete, sempre foi, das janelas deste jornal, que escancaram sobre o Tejo, a alegria.
Este jornal, Gabinete, tem, da História, a noção de que deve à Armada a costa de África, o Cabo, a ilha de Moçambique, a Taprobana, Calecut e Dili.
O mais jovem dos nossos repórteres vê na Armada o "Adamastor", Machado dos Santos, o "Augusto de Castilho" e o almirante Rosa Coutinho.
Não há, neste jornal, contra a Armada, o mais leve rebuço.
A revolução, Gabinete, porque há-de ela assumir, da seriedade, o espírito, da opacidade, a espessura, da mediocridade, a teima?
É velha a questão.
Tão velha como a Marinha.
Que nem a crítica nem os ataques são ofensa e que uma e outra coisas são, também, a fecundidade e a dialéctica da democracia.
Reabrir, hoje, nesta revolução, perante este jornal, numa fase tão grave da vida desta revolução, e deste País, esta polémica, tão fácil para nós, tão lamentável para o Gabinete, inaugurar, contra a inteligência, contra a liberdade, contra a crítica, contra a alegria, esta frente de batalha - que significa isto?, que quer isto ocultar?, que insuficiência projecta?, que sanha compensa?, que derrota camufla?
Há, depois, e finalmente, uma coisa grave, Gabinete, que é - a ameaça.
Que é, sic, " o aviso solene de que a Armada se reserva o direito de actuar revolucionariamente, em justa defesa do seu prestígio, se casos de idêntica natureza se voltarem a repetir ".
Isto é - A ABORDAGEM!
Está, pois, este País, habilitado ao espectáculo único na Europa que é haver, entre a Armada e um jornal, uma batalha - naval.
Poderá ser assim.
O "Jornal Novo" deita, no largo de Santa Catarina, o ferro.
A Armada passa ao largo.
O "Jornal Novo" arreganha, num mastro, duas tíbias cruzadas, e uma caveira.
A Armada abre, rotundo, nutrido, o fogo.
O "Jornal Novo" lança, em torpedo, uma fotomontagem.
A Armada sulca, na direcção pirata, o Tejo.
O "Jornal Novo" arremessa, em torpedo, a segunda fotomontagem.
A Armada encurrala, entre os seus costados de aço, o "Jornal Novo".
No convés do "Jornal Novo", agitam-se, facas nos dentes, papagaios nos ombros, lenços atados ao crânio, os redactores.
O comandante Correia Jesuíno varre, de um só golpe de escopeta, o convés, e abre, entre Antilhas morais, entre pernas de pau, entre barris de rum, caminho, na direcção de um homem enorme, de barba preta, de nariz adunco, que está escrevendo, no seu camarote - um editorial.
Talvez o último.
Talvez este.
E é no mastro mais alto, na ponta do cabo mais áspero, entre hurras viris dos fuzileiros, entre tripulações inteiras que agitam as boinas, entre flâmulas, entre tiros secos, e brancos, entre o buzinar de festa, que é, finalmente, justiceiramente, enforcado - o director do "Jornal Novo".
Outro dia, Gabinete, esteve aqui, neste jornal, discutindo uma qualquer miudeza, isso!, a revolução cultural, um escritor que é marinheiro, um Pierre Loti feroz, - o meu amigo Ramiro Correia.
Pergunta este jornal, directamente, - estava ele nesta Assembleia, levantou, ele, nesta Assembleia, contra o "Jornal Novo", contra as fotomontagens, contra Rafael Bordalo Pinheiro, contra o sorriso da pequena História, contra a memória visual de um futuro implacável, contra o direito à alegria, à crítica, contra o dever da inteligência, da abertura, o seu braço, a sua voz, os seus galões?
Esta votação, Ramiro, é, ela, a revolução, a cultura, ambas, ou nenhuma? Que erro é este, político, seu, de passar, a um jornal incómodo, um atestado de força? Que erro é este, cultural, e político, revolucionário portanto, seu, de passar, a si próprio, a uma sala branca, um atestado de incapacidade?
Por quanto tempo nos lembraremos todos, todos os jornalistas, todos os escritores, todos os poetas, todos os cronistas, todos os historiadores, com um sorriso terrivelmente português, dilacerantemente lisboeta, e não só, deste comunicado que declara guerra a um jornal, deste comunicado que proíbe a caricatura, deste comunicado que confunde humor com ofensa, deste comunicado que invoca a revolução para vir escavacar talvez meia dúzia de secretárias, e arremessar, talvez, pelas janelas, meia dúzia de máquinas de escrever?
Com esta grandiloquência de quem faz História às pazadas, de quem traz o nome, a seis colunas, no cabeçalho de qualquer jornal, não estarão alguns protagonistas desta revolução a deixar que, amanhã, fique deles, não o Rádio Clube Português, não o "Diário de Notícias", não o "Diário de Lisboa", mas estes indícios, feitos de trágico e feitos de cómico, que são estes comunicados, estas ameaças, estas batalhas navais?
É para esta opacidade que se fez, Ramiro, esta revolução?
Este Gabinete sabe de quem é o retrato que o traço de Rafael Bordalo Pinheiro faz?
Pois é do senhor Dom Luís, que foi, deste País, não ministro da Comunicação Social, não Primeiro-Ministro indigitado, não director de um jornal da manhã - mas rei.
Rei e tradutor de Shakespeare.
Este Gabinete sabe onde está, entre outros retratos, este retrato?
Pois está no "Álbum das Glórias", painel do Constitucionalismo.
E julga este Gabinete, tão revolucionário, tão culto, tão comunicável, tão ameaçador, que o Constitucionalismo e o Senhor Dom Luís, que toda a gente sabe muito moderadamente subtis, protestaram, eles, mandaram, eles, pôr uma fragata em frente da casa do sr. Rafael Bordalo Pinheiro, ameaçaram, eles, o "António Maria" de mandar dois marinheiros destroçar a tipografia, empastelar os tipos, partir os lápis?
Não, hélas, Gabinete.
Eles não fizeram nada disso. Só porque eles, apesar de obesamente monárquicos, de vagamente liberais, de cautamente letrados, sabiam duas coisas muito simples.
Uma coisa é que o jornalismo tem o direito, e o dever, da crítica, da alegria, da invenção.
Outra coisa é que mandar um comunicado, uma fragata, ou dois marinheiros, destroçar um atelier, uma tipografia, um lápis que seja, é - um suicídio cultural, um suicídio moral, um suicídio político.
Excelente é que este Gabinete defenda, ele, não a liberdade de navegação, mas a liberdade de Imprensa.
E aí, não sabendo nós, de barcos, coisa nenhuma, sabemos nós alguma coisa.
Sabemos, por exemplo, coincidência!, que foi exactamente uma das nossas fotomontagens, chamada Correia Jesuíno, que fez chegar ao Conselho da Revolução, nas mãos de outra das nossas fotomontagens, chamada Rosa Coutinho, o projecto de lei que a maioria esmagadora dos trabalhadores da Imprensa considerou uma tentativa de restabelecimento da censura.
Aparentemente, há políticos portugueses que dão fotomontagens. Mas há políticos portugueses que sãofotomontagens.
Interessante seria, histórico seria, revolucionário seria, que este Gabinete, tão leitor das primeiras páginas deste jornal, tivesse feito, ele, semanas atrás, outra nota que seria, essa, assim:
"A ASSEMBLEIA DA ARMADA VERIFICOU QUE, MAIS UMA VEZ, A IMPRENSA FOI TRATADA PELO MINISTRO DA COMUNICAÇÃO SOCIAL, DE UMA FORMA OFENSIVA DO PRESTÍGIO E DIGNIDADE DO JORNALISMO.
CONSTATANDO QUE A APRESENTAÇÃO PELO COMANDANTE CORREIA JESUÍNO DE UM PROJECTO DE LEI QUE AMEAÇA A LIBERDADE DE IMPRENSA, AO CRIAR UMA COMISSÃO DE ANÁLISE E AO INSTITUIR MULTAS ATÉ 500 CONTOS E PENAS DE SUSPENSÃO ATÉ 180 DIAS, A ASSEMBLEIA SAÚDA O JORNAL NOVO PELA SUA FRONTALIDADE AO DENUNCIAR ESTA INIQUIDADE E AVISA SOLENEMENTE OS INIMIGOS DA LIBERDADE DE IMPRENSA QUE SE RESERVA O DIREITO DE ACTUAR REVOLUCIONARIAMENTE, EM JUSTA DEFESA DO PRESTÍGIO DA REVOLUÇÃO, SE CASOS DE IDÊNTICA NATUREZA SE VOLTAREM A REPETIR."
Embora este comunicado não tenha, ao que parece, sido publicado, talvez fosse este um pouco o sentido das palavras do indigitado Primeiro-Ministro quando, perguntado sobre o destino do sr. comandante Correia Jesuíno, respondeu:
- Está dentro dos meus planos pedir-lhe para descansar.
Admirável Gabinete, este jornal regista o teu aviso solene.
Até porque, Gabinete, este jornal há uma coisa que não tem - é medo.
Este jornal avisa, ele, solenemente o Gabinete do Chefe do Estado-maior da Armada de que se reserva o direito de actuar revolucionariamente, em justa defesa, não apenas do prestígio do jornalismo, mas do próprio prestígio da Armada, se casos de idêntica natureza se voltarem a repetir.
É que, entendamo-nos, Gabinete, não é principalmente o prestígio da Imprensa que está em causa. Nem o prestígio de Rafael Bordalo Pinheiro.
Com esta nota deliciosa, com esta nota que já entrou na História, que, obrigado, Gabinete, nos ajuda a ocupar, lá dentro, um lugar confortável, e vistoso, com esta nota que é um teste psicológico, cultural, político, o que está em causa é o prestígio - do Gabinete.
Portanto, Gabinete, este jornal reserva-se o direito de actuar revolucionariamente pela inteligência, pela alegria, pela crítica.
Este jornal reserva-se o direito de esperar que a Armada responda à inteligência com a inteligência, à alegria com a alegria, à crítica com a crítica.
Este jornal reserva-se o direito de esperar que a Armada mantenha, da largueza, do horizonte rasgado, a sua tradição.
Este jornal espera que a Armada não deite ferro na pequenez, e no ridículo, desta nota, e se faça ao alto mar da grandeza que esta revolução tem de ser. ''
E o marujo-censor ficou para sempre imortalizado.....
A propósito, como se chama o gajo com quem Santana-Maia se recusou a lutar porque o achava um
?????
Miguel Abrantes
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