Execução de sentença entre o procurador do Tombo da Comenda do Pinheiro Grande, contra Jacinto de Castro, dono da Quinta de Santa Bárbara em Punhete.
140 €
59 páginas
Se o Arquivo de Constância não comprou isto, a que se dedicam?
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Foto antiga da procissão de Santo António, em Constância Sul.
Fotos dos azulejos sobre os milagres do Santo
Matias e Jacobo, alemães, mercenários ao serviço régio, desertores da Praça de Albuquerque, mataram outro estrangeiro, em Junho de 1739, junto a Punhete, despojando-o dos bens e deitando o cadáver nu ao rio.
Depois de julgados, foram condenados à morte, e executados em 20 de Julho de 1739, no Campo da Lã, sendo-lhes cortadas as mãos e as cabeças, e espetadas em altos postes.
A informação é dum Jurisconsulto , num alfarrábio do século passado.
No apontamento que seguimos, evaporou-se o nome do Doutor, quando o encontrarmos, será dado o seu a seu dono.
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A vila de Constância (antiga Punhete) e a sua antiga Torre emblemática andarão ligadas à história prodigiosa da Restauração de 1640. Simão Coelho, Deputado do Santo Ofício, revela-nos um episódio dito prodigioso ocorrido em Punhete possivelmente ainda no final do século XVI (?) de que teve conhecimento através de seu irmão, Nuno Coelho. Do Tejo terão surgido vozes proféticas de meninos invisíveis a aclamar o duque de Bragança: «Real, Real, por Dom JOAM M Alto Rey de Portugal».
O «homem Santo» a quem as vozes se destinavam era, nem mais nem menos, Frey António de Sande, dominicano, sacerdote de «esclarecidas virtudes», bem conhecido no reino pelo seu «Santo exemplo». Em Constância, na Torre do antigo Castelo e então Palácio dos Sandes, terá testemunhado o caso raro da profecia da restauração…Este caso, registado pelo deputado do Santo Ofício, Simão Torrezão Coelho (1) , foi ouvido por este a seu irmão, Nuno Coelho, contador do mestrado de Cristo. Acontecera que Nuno Coelho, vindo a Lisboa em 1642 «beijar a mão a El Rey nosso senhor, que Deus guarde», lhe referiu o episódio «que mais de vinte anos antes da feliz aclamação de El Rey Nosso Senhor» lhe contara a mulher. Dissera então Nuno Coelho a seu irmão, o seguinte: que soube por sua mulher , Dona Luiza de Sande, que o tio dela – passa-se a transcrever – «Padre Frey António de Sande, Religioso da Ordem de São Domingos, e de vida mi exemplar, estando uma vez na Vila de Punhete com suas irmãs Dona Antónia de Sande, e Dona Joana de Andrada, se fora para uma torre das casas de seu irmão Dom Francisco de Sande, em que viviam, e onde o dito religioso costumava ir, as mais das tardes, rezar o ofício divino, e encomendar-se a Deus, e descendo da dita torre, pouco antes das Avés Marias, lhes dissera muito espantado, a ela Dona Luiza e às ditas suas irmãs:«Venho senhoras, assombrado do que agora aconteceu, estando rezando na torre (verdade é que tinha Portugal no coração), ouvi muito claramente para junto ao Tejo vozes de meninos, que por três vezes, disseram Real, Real, por Dom JOAM M Alto Rey de Portugal, e chegando à janela da torre, para ver o que aquilo era, não vi pessoa alguma: vede vós agora, que Dom JOAM há aí que haja de ser Rey deste Reino?».
Simão Coelho, que também era da Cruzada, acrescenta ao caso o seu testemunho: «E indo eu o Outubro passado por ordem de Sua Majestade a Tomar, falando com a dita Dona Luiza de Sande minha cunhada nesta matéria, ela por várias vezes me tornou a contar o que acima tenho referido, o que juro in verbis Sacerdotis, Lisboa. 28.de Fevereiro de 1642. Simão Torrezão Coelho. Deputado da mesa da consciência do santo Ofício e da Santa Cruzada».
O homem do Santo Ofício achou um mistério digno de ponderação, ter o Padre Frey António ouvido estas vozes em forma que pareciam de meninos. E, sem entrar «na relação destes mistérios», dirige-se a Jesus, o Senhor, dada a grande estimação que Este fez das vozes das crianças de peito pois, «aperfeiçoam os louvores». Prodígios semelhantes terão sido relatados ao Bispo de Viseu, então Reitor da Universidade de Coimbra, Manuel de Saldanha. Deu-se o caso de uma criança «que não falava nem falou depois disso». Estando nos braços de sua mãe, dissera em voz clara e inteligível: «Viva El Rey Dom João IV» (testemunho de Frey Philipe Moreira, 1642).
Palácio da Torre. Foto de Arnaldo Fonseca. No trem de navegação vem El Rei Dom Carlos e o seu séquito.
Nesta sua carta de 1642, Simão Coelho, tratando das qualidades de Frey António de Sande, fala em «haver mais de trinta anos que passou desta a melhor vida». A ser assim, então a profecia dos meninos invisíveis do Tejo pode ter ocorrido ainda no século de Camões. Ou na primeira década do seguinte.
José Luz
(Constância)
PS – não uso o dito AOLP. Mais um dominicano, Frey António de Sande, no caminho de Camões…
O tipo que era Juiz de Fora, ou seja Presidente da Câmara , Gaspar Pereira da Silva e Navarro, natural da vila abrantina, provavelmente mentiu no processo. Sustentava que o requerente, outro Gaspar, Pessoa, era nobre e tinha ascendência relacionada com os Pessoa e Amorim de Coimbra. (1)
Outra testemunha, cá da zona, Joaquim Alexandre de Sousa Fragoso, ''fidalgo de S.Majestade, vigário colado de São Julião de Punhete,'' também disse que o judeu Gaspar tinha nobres costados (o que era rotundamente falso) e grossos cabedais (o que era verdade). (2)
Pretendia enobrecer o rico descendente duma família de cristãos-novos do Fundão (aparentado com os Bívares cá do burgo) e fazer esquecer um passado ainda até há pouco vergonhoso, passava pouco tempo que Pombal abolira as distinções entre gente de nação e pessoas com ''sangue limpo''.
Isto é o que consta nos autos de Justificação de nobreza do Gaspar Pessoa, que foi o homem que se encarregou da manutenção das pontes de Punhete e Abrantes, durante as invasões francesas e ao mesmo tempo tinha rendosos negócios com a tropa.
Também consta uma árvore genealógica provavelmente falsificada.
O divulgador Manuel Castelo Branco deixou-se enganar pela falsificação setecentista, ao estudar esta ascendência, num estudo de 2008, que a autora que seguimos, Gislaine Gonçalves Dias Pinto (''Perseguição, Nobilitação e Mácula de Sangue Cristão Novo, A trajectória da família Pessoa Tavares, (1706-1816)'') desmonta documentalmente.
O Gaspar seria enobrecido. Comendador de Cristo. Etc. Nada mau para um descendente de mercadores do Fundão, que ainda há pouco judaizavam.
O filho do Gaspar, também Gaspar, Pessoa Tavares de Amorim da Vargem, foi barão e Visconde da Vargem, Amorim sem o ser, Comendador de Nossa Senhora de Vila Viçosa e de Cristo, Coronel, Morgado e Vereador da Câmara de Lisboa. .....
A tese da doutora Gislaine é um magnífico contributo académico para o estudo da ascensão social da alta-burguesia no período pombalino.
Finalmente desta família Pessoa.......descende Fernando António Nogueira Pessoa, ''Príncipe da Nossa Baviera'' ( Eduardo Lourenço dixit).... que nunca teve entre os antepassados, nobres medievais, pelo lado Pessoa...., por mais que um Presidente da Câmara, natural de Abrantes, tenha ajudado a falsificar uma genealogia....
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(1) e (2) in Gislaine Gonçalves Dias Pinto , Perseguição, Nobilitação e Mácula de Sangue Cristão Novo, A trajectória da família Pessoa Tavares, (1706-1816 ),tese de doutoramento na U. de Minas Gerais, 2016
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A descoberta recente de possíveis elementos de um altar da antiga paroquial de São Julião de Punhete (actual Constância) levou a Mesa Administrativa da Misericórdia a projectar um núcleo museológico e expositivo. Está um curso uma candidatura à Tagus, tendo o Montepio provido uma carta de conforto para esse efeito, segundo o Provedor, António Paulo Teixeira.
Ao que apurei junto daquele responsável, os técnicos superiores envolvidos na restauração da Igreja da Misericórdia (empresa de Conservação e Restauro de Torres Vedras) terão equacionado a hipótese dos elementos em causa descobertos (ver fotos) serem estranhos aos altares, retábulo e características da igreja da Irmandade, em cujo seio se fez a fascinante descoberta. Anote-se que este património encontrava-se num sótão da sacristia desde há muito tempo. A imagem do senhor dos Aflitos será também anterior à construção da Igreja da Santa Casa, sendo atribuída aos século XV ou XIV o que poderá provar a sua origem distinta.
Os restos do altar enigmático terão sido guardados pela Irmandade, crê-se, desde pelo menos 1822, data da transladação da antiga paroquial de São Julião (situada na actual Praça Alexandre Herculano) para a Igreja de Nossa Senhora dos Mártires (1).
A instalação de um núcleo museológico e expositivo na sacristia da igreja da Irmandade da Misericórdia de Constância irá contemplar artefactos e peças várias do espólio da igreja da Irmandade e ainda da antiga paroquial ( origem a comprovar-se, é certo, segundo a hipótese em estudo).
A antiga paroquial de São Julião terá sido arruinada pelos invasores franceses, na primeira e terceira invasões (2). O saudoso Cónego José Maria Rodrigues d’Oliveira dizia que a Pia baptismal da actual Matriz tinha sido transladada da igreja de São Julião e contava com pelo menos oito séculos. A expressão «antiga igreja» constante do despacho régio (1) vem corroborar esta conjectura.
Um outro dado muito relevante vem juntar-se a este puzzle alegadamente quinhentista, do altar descoberto. Segundo o testamento dum antigo Provedor da Misericórdia, Dom Francisco de Sande (2) (3), o seu corpo deveria ser sepultado precisamente «em sepultura de meus Avós, que era em a Capela maior da Paroquial Igreja de S. Julião, de Vila de Punhete, ao longo do primeiro degrau; e aos lados estão muitos Irmão e Primos e Tios meus».
Sabemos que a avó dos amigos de Camões (Heitor da Silveira e João Lopes Leitão), do célebre «Banquete das Trovas» terá morrido em 1544 e foi sepultada na Igreja de S, Julião de Punhete (4)
Será que estes restos do altar não serão da Capela maior da velhinha paroquial?
Manuela de Azevedo, saudosa fundadora da Associação da Casa-Memória de Camões em Constância escreveu um dia a «Mágica visão» em que via o poeta a rezar ali na velhinha paroquial de São Julão, paredes meias com a Casa dos arcos e, o palácio da torre onde teria sido prisioneiro.
Será este altar contemporâneo de Camões? Têm a palavra os técnicos e especialistas. À Santa Casa, os agradecimentos pelas informações e fotos.
José Luz (Constância)
PS – não uso o dito AOLP
(1) «Manda El Rei, pela Secretária de Estado dos Negócios de Justiça, que o Reverendo Bispo de Castelo Branco, em conformidade da sua informação, sobre o requerimento do Juiz Presidente e Oficiais da Câmara da Vila de Punhete, faça expedir os despachos necessários, para que a Paróquia da dita Vila, seja transladada, para o Templo dedicado a Nossa Senhora dos Mártires, em razão de estar arruinada a própria, e antiga igreja de S. Julião da dita Vila, combinando-se as horas para que diariamente, os Capelães daquela igreja celebrem as Missas solenes e privadas, e o Pároco da de S. Julião todos os Ofícios Divinos, e administre os Sacramentos: sem perturbação daqueles a que são obrigados os ditos Capelães: fazendo-se Termo, com as devidas declarações, assinado pelo Pároco, Câmara, Mesários da Confraria, e mais Pessoas a quem competir. Palácio de Queluz, em 25 de Fevereiro de 1822. = José da Silva Carvalho.» - Diário do Governo, edições 77-151, página 670.
(2) «Logo na primeira invasão que se verificou nesta Vila no dia 24 de Novembro de 1807 data a ruína dos templos desta Vila (…) Nestes calamitosos dias sofreu o povo desta vila incalculáveis incómodos; foram as casas abertas à tropa, o que se apregoou com pena de morte; os templos franqueados, desacatados e delapidados, ficando este povo tímido, convulso e arruinado, o que totalmente aconteceu na última invasão de… Novembro de 1810 (…)Terra alguma do Ribatejo se pode comparar com esta ruína (…) Que a famosa igreja, obra dos mais remotos séculos, que a paroquial de S. Julião, «que era um monte de oiro», como dela disse o seu Comendador Forbes, que a nossa antiga Mãe, onde descansam os restos dos nossos tão dignos Antepassados, está reduzida à maior indigência, sendo antes decorada com belíssimos quadros e painéis de Grão Vasco, e de outros insignes autores, e o tecto da capela-mor, da mais preciosa arquitectura, e os cinco altares que tinha, enobrecidos com tronos todos doirados, e particularmente com imagens, as mais expressivas e devotas». - Descripção da Vila de Punhete, Verísismo José de Oliveira, 1830, Transcripção, Prefácio e Notas Complementares de José Eugénio de Campos Godinho, 1947.
(3)Testamento de D. Francisco de Sande, de 1 de Janeiro de 1620.
(4)Garcilaso, Principe de poetas, una biografia, Maria Del Carmen Vaquero Serrano, Centro de Estudios Europa-Hispânica, 2013.
450º aniversário da elevação de Punhete a Vila
e da autonomia administrativa do Concelho
extracto da publicação inédita da carta régia de 30 de Maio de 1571, publicação da Academia das Ciências de Lisboa.
No próximo dia 30 de Maio de 2021 a Vila de Constância comemorará o 450º aniversário da sua elevação a Vila e da confirmação de iure (de direito) do seu Concelho, o qual já existia «de facto» à data da carta de sentença do Rei D. Sebastião, «com toda a jurisdição». Segundo a petição levada ao rei, o lugar de Punhete (designação anterior de Constância) «não tinha outra diminuição», cita-se, «somente irem os juízes antes que comecem a servir seus ofícios tomar juramento à Câmara de Abrantes», bem como as apelações terem de ir também ali primeiro, antes de irem à Relação do Rei. Na petição reproduzida na sentença, cita-se «grande inconveniente» por causa daquela diminuição da jurisdição e por causa dos presos detidos, das apelações, dos gastos, entre outros argumentos.
Até então o lugar de Punhete pertencia ao Termo de Abrantes. A carta régia de 30 de Maio de 1571 está registada nas folhas 97 a 99, do Livro de Registo nº 3 da Câmara Municipal de Abrantes (1). A separação do lugar de Punhete, com Termo separado do de Abrantes, e a sua elevação a Vila, deve-se em parte, sintetiza Morato, «por ser já então uma povoação de quinhentos vizinhos e prometer um progressivo aumento, em razão da muita gente que de todas as partes ali afluía em romaria a Nossa Senhora dos Mártires, aliviando-a ao mesmo tempo do pagamento dos 400 réis anuais que, como ónus de sujeição, era obrigada a satisfazer à Câmara de Abrantes». (1)
O padre Carvalho da Costa, à semelhança de outras fontes antigas, dá-nos conta de que «El Rei D. Sebastião a fez Vila por quarenta homens honrados (sendo alguns deles de sua Casa) que com seus cavalos, e criados o acompanharam, quando foi a África, como consta de uma provisão do mesmo rei, que se conserva no cartório da câmara desta vila, que antigamente tinha seiscentos vizinhos».(2) Ao que se sabe por vários autores o invasor francês terá destruído os arquivos oficiais então existentes.
Segundo ainda Morato (1) em 1578 D. Sebastião escreveu ao alcaide-mor de Abrantes, D. João de Almeida. Com o propósito de levantar gente «para a jornada de África». Na monografia que vimos seguindo adianta-se que o alcaide alistou bastante gente na Vila de Abrantes e suas imediações mas, prossegue Morato, «ignoram-se os seus nomes, porque os historiadores desse tempo só nos transmitiam os dos grandes e nobres».(1)
Na nossa vila de Constância, então Punhete, se demorou o rei pela última vez por alguns tempos (por aqui se refugiou inicialmente da peste como relatam os cronistas), «fazendo convites à principal nobreza das vilas circunvizinhas para o acompanharem na jornada de África». É o que nos revela também, no caso, o autor da monografia de Constância do início do século XIX: «e desta vila o acompanharam quarenta cavaleiros de espora doirada que foram entregues a D. Cristovam de Távora». (3)
Pêro de Alcáçova Carneiro, futuro Conde da Idanha, personagem muito influente no reinado de D. João III e durante a menoridade de D. Sebastião, tinha terras em Punhete (6). Acredito que foi ele (Secretário do reino) que trouxe a Punhete a Regente Dona Catarina à Senhora dos Mártires onde também vinha em novena. Parece que caiu em desgraça em 1569 e se recolheu numa comenda da Ordem de Cristo em Idanha-a-Velha. Ora, em 1575, estava em Punhete (6). Nesse ano faleceu o padre Luiz Gonçalves da Câmara, confessor do rei, da família do Palácio da Torre de Punhete. 1576 é o ano da primeira reabilitação política de Pêro Carneiro, senhor de terras em Punhete. Por decreto de 7 de Maio de 1576 entrou no governo, de parceria com Manuel Quaresma Barreto e D. Francisco de Portugal. Segundo o Dicionário Histórico Portugal, foi encarregado duma missão junto de Filipe II, tendo demostrado dupla habilidade como diplomata nas negociações com o ministro espanhol duque de Alba, conseguindo vantagens negociais para D. Sebastião. Sabe-se que depois, em Alcácer-Quibir, pereceram os seus dois filhos, Luís e Cristóvão. Logo a seguir à perda da batalha (Pêro Carneiro era Vedor da Fazenda e um dos cinco governadores que substituia o rei na sua ausência), foi preso pelo infante D. Henrique. Veio a ser reabilitado quando Filipe tomou conta disto, sendo nomeado Conde das Idanhas. É crível que este senhor de terras em Punhete tenha tido um papel no recrutamento dos cavaleiros da jornada de África. Já vimos que em 1577 o rei estava em Punhete nessa empresa que lhe veio depois a ser fatal. Será que Luís e Cristóvão moravam também em Punhete? É bem possível. É preciso investigar estas relações.
Retornando ao tema… Justiça seja feita, deve-se à Academia das Ciências de Lisboa a inédita publicação da carta de sentença Sebástica favorável a Punhete, (4).
Na origem da carta régia está uma formalidade, claro. Mas de peso. O monarca refere uma petição dos juízes vereadores e procurador e povo do lugar de Punhete em que estes pedem que o rei houvesse por bem «que o dito lugar se chamasse vila e que os juízes e oficiais não fossem tomar juramento à câmara da dita vila de Abrantes e que as apelações fossem directamente à minha Relação onde pertence(…)». (4)
Da carta régia consta que em Punhete havia dois juízes ordinários e três vereadores e um procurador do concelho e que estes oficiais, «havia muitos anos que os havia e que tinham todo o Regimento do Concelho e que assim havia um alcaide-pequeno que apresentava o alcaide-maior de Abrantes e a câmara conforme a ordenação e que havia dois tabeliães do publico e judicial, e escrivão da câmara e almotaçaria e juiz e escrivão dos órfãos contador inquiridor e dois procuradores do número juiz e escrivão das sisas e recebedor delas e que assim havia no dito lugar casa e audiência da câmara e casa da cadeia e pelourinho suas argolas e cepo e açougue(…)». (4)
E antes de lhe dar despacho o rei mandou que o corregedor da comarca da vila de Tomar fosse ao lugar de Punhete e se informasse do conteúdo na dita provisão. O parecer do corregedor satisfez a ordem e foi enviado o auto. Da sentença: «(…)e quero que daqui em diante para sempre se chame Vila de Punhete(…)».
Manoel da Veiga, biógrafo do «Sapateiro Santo», Simão Gomes, conta-nos que o rei deferindo um pedido de Simão Gomes fez Punhete, Vila (5). Parece que o lugar de Punhete era quase todo dos parentes de Simão Gomes. O rei teria sido muito bem recebido aqui quando se refugiou da peste e os locais, na altura certa, pediram a intervenção do «Sapateiro Santo»…
José Luz (Constância)
PS - não uso o dito AOLP
(1)Memória Histórica da Notável Vila de Abrantes, Manuel António Morato, João Valentim da Fonseca Mota; organização e notas de Eduardo Manuel Tavares Campos, Edição de CMA, 1981, página 101.
(2)Corografia Portuguesa, tomo terceiro, padre António Carvalho da Costa, Lisboa MDCCXII, página 182.
(3)«Descrição da Villa de Punhete», por Veríssimo José de Oliveira, 1830, Transcrição, prefácio, e notas complementares por José Eugénio de Campos Godinho, Torres Novas, 1947. Nota minha: a saudosa jornalista Manuela de Azevedo fundadora da Associação da Casa Memória de Camões em Constância, disse-me um dia que tinha na sua posse este manuscrito original.
(4) «Cartas de vila, de mudança de nome e do título de Notável das povoações da Estremadura, Pedro de Azevedo, Coimbra, Imprensa da universidade, 1921, páginas 57 e ss.
(5) «Vida, virtudes e doutrina admirável de Simão Gomes», Manoel da Veiga, Lisboa, MDCCLIX.
(6) «Miscelânia Pereira de Foios», José Torrejon, 2017, Imprensa Nacional.
Vestígios e laços de historicidade
No aniversário dos 380 anos da Restauração de Portugal (1º de Dezembro) tomemos nota de alguns indícios de resistência popular ao domínio filipino, no caso, em Punhete. Uma vila a que também andam ligados talvez indirectamente, nomes famosos da Restauração. Descubra aqui… lendo.
A história dificilmente se poderia repetir hoje em dia (?), tempos de uma União Europeia em que o conceito clássico de Estado já não é o que era e o espírito revolucionário, com excepção do período de 1975, em particular, parece adormecido…
Há precisamente 380 anos ocorria a chamada «Restauração da Independência de Portugal» como país pretensamente soberano. Com efeito, nesse dia, o grupo denominado de «Os Quarenta Conjurados» chefiou o golpe de estado revolucionário. Miguel de Vasconcelos, o traidor, era atirado pela janela, no Paço da Ribeira.
A revolta dos portugueses alastrou-se então por todo o Reino culminando com a instauração da 4ª Dinastia Portuguesa da «Casa de Bragança» em que D. João IV é aclamado Rei. Na vila de Constância, então designada Punhete, existia um foco de resistência ao domínio filipino, como se infere do relato do historiador Oliveira Marques e se verá sumariamente a seguir.
Ligado à Restauração temos, por exemplo, D. Miguel de Almeida, Conde de Abrantes e Alcaide-Mor de Abrantes, de Punhete e da Amêndoa, no caso, um dos Quarenta Conjurados : «(…) com que valor se portou no acto de aclamação de El Rey Dom João Quarto (…)» (1)
Vale a pena recordar aqui o episódio famoso protagonizado por uma descendente de Dona Guiomar Freire (2), castelã de Punhete, no caso, Dona Filipa de Vilhena, a fazer fé na genealogia da antiga Conservadora do Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Diz-nos o «Portal do Dicionário Histórico» que Dona Filipa «teve conhecimento de todos os preparativos da revolução de 1 de Dezembro de 1640», tendo aconselhado a seus filhos que «a ela aderissem e partilhassem os perigos de seus irmãos em fidalguia e em nacionalidade». Na madrugada de 1 de Dezembro, pode ler-se, «cingiu ela própria as armas aos seus dois filhos, e mandou-os combater pela pátria, dizendo-lhes que não voltassem senão honrados com os louros da vitória». Adianta ainda esta fonte que «não foi ela só que procedeu assim nessa madrugada célebre. O mesmo fez D. Mariana de Lencastre». Não se conhece (?) o motivo pelo qual ficou apenas no espírito popular o nome de D. Filipa de Vilhena.
Mas o rastilho mais importante da revolução parece remontar a 21 de Agosto de 1637, três anos antes, com a conhecida «Revolta do Manuelinho ou «Revolta do Manelinho» em Évora, de cariz popular.
O anúncio de novos impostos (água e sisas) estará na origem dos acontecimentos eborenses que começou nas ruas e levou a que incendiassem as moradias de nobres e de representantes locais da coroa espanhola.
É então instituída uma Junta Governativa popular, de auto-governo, a qual passa a emitir comunicados assinados pelo «Manuelinho» um «louco» bem conhecido que vagueava pela cidade…
Esta revolta tomou rapidamente grandes proporções, alastrando-se a outros pontos do Reino. Oliveira Marques (3) relata-nos: «(…) a famosa Revolta do Manuelinho, em Évora (Agosto de 1637) deu a faísca para cerca de 70 motins, a partir de Setembro daquele ano, em todo o Algarve e o Alentejo, e até a norte do rio Tejo, em Santarém, Golegã, Punhete, Abrantes, Sardoal, Mação, Envendos, Ferreira, Sobreira Formosa, Águas Belas e Beco, com extensões no tempo até Março de 1638. Mau-grado a repressão das autoridades, voltou a haver motins em 1639 e em 1640 (…)».
No ano seguinte (1639) Filipe II de Portugal via-se obrigado a mobilizar dois exércitos com cerca de 10 mil homens para subjugar as regiões revoltadas.
Segundo o «Avante», órgão oficial do PCP – Partido Comunista Português, «Conhecida como as Alterações de Évora, a revolta do Manuelinho é apontada como precursora da conspiração que levou à independência em 1640». Na súmula editada pelo PCP lê-se ainda: «a época é de crise geral, afectando todo o homem, em todas as suas actividades: económica, social, política, religiosa, científica, artística, e em todo o seu ser, no mais profundo da sua potência vital, da sua sensibilidade e da sua vontade». Actual e sintomática esta recente publicação comunista?
Há três anos atrás, numa encenação histórica em Santa Cruz, na ilha da Madeira, o povo, qual Torquemada dos dias correntes, atirou de novo o traidor pela varanda. Não serão porventura reminiscências do antigo espírito inquisitorial que mandava desenterrar os mortos para os julgar ou mandava queimar as suas efígies. Seria apenas uma diversão, restaurado o feriado nacional…
Dizem os entendidos que foi o levante da Catalunha que proporcionou a acção dos conjurados. Da Catalunha terá sido importado pelos Templários o nome da vila de Punhete, como já escrevi noutro artigo. Dizem que não há coincidências…Defronte da vila de Punhete, na margem norte do «Rio», no Outeiro da Conceição, no local do antigo castelo medieval, foi construída uma fortaleza, restaurada para as guerras da Restauração e para a Campanha do Conde de Lipe (5).
As guerras sempre acompanharam a história da humanidade e até constam da Bíblia.
Uma outra informação muito curiosa: Diogo Soares, Senhora da vila de Punhete e Comendador da Ordem de Cristo é apontado como Secretário de Estado, em Madrid, de Filipe IV de Espanha e Portugal (6). Ora, Miguel da Cunha (6) afirma que Miguel de Vasconcelos, o traidor, anote-se, era o sogro deste Diogo Soares, Senhor de Punhete. Nesta obra também consta, em nota de rodapé que «Diogo Soares casou, segundo os genealógicos, pelo menos três vezes, a última com Dona Antónia de Melo, filha herdeira do famoso ‘desfenestrado’, de quem houve geração (…)».
Na vila de Constância existia uma banda filarmónica 1º de Dezembro no 1º quartel do século XX, do Mestre Brito (onde tocava bombardino o meu bizavô paterno, Francisco da Luz, sapateiro na Praia do Ribatejo). A esta banda sucedeu outra, com a mesma designação, cujo maestro era o meu avô materno Carlos Amadeu Saraiva Silvares de Carvalho. No dia 1º de Dezembro a banda fazia a arruada pela vila com o hino da restauração e eram recebidos pelos populares A música dava o mote: «Tragam passas e aguardante, cá pra gente, cá pra gente».
José Luz (Constância)
Em 1755, por Setembro, um homem de Santa Margarida, foi à festa do Espírito Santo, em Punhete. Chamava-se Lourenço Ferreira e dedicou-se a blasfemar, estaria chateado.
Entre outras coisas interessantes, tinha por hábito dizer que '' “nem frade nem nenhum dos que serviam o Espírito Santo eram mais que ele e nem capaz[es] de falar diante dele”, e que “o Espírito Santo” ali festejado “não era capaz de andar debaixo das solas de seus sapatos”. (1)
Resultado foi detido pelo Santo Ofício e teve tratos de polé, graças às denúncias das beatas contra o barqueiro livre-pensador.
O doutor IGOR TADEU CAMILO ROCHA, da Universidade de Belo Horizonte, nesta tese de doutoramento, '' ENTRE O ‘ÍMPETO SECULARIZADOR’ E A ‘SÃ TEOLOGIA’: TOLERÂNCIA RELIGIOSA,
SECULARIZAÇÃO E ILUSTRAÇÃO CATÓLICA NO MUNDO LUSO (SÉCULOS XVIII-XIX)'' (2019), estuda este assunto. O académico brasileiro dá-nos uma grande obra relacionada parcialmente com a História da Região e começo a pensar que há que ler a produção brasileira, como recomendaria o António Hespanha ou o Fernando Catroga, para descobrir coisas novas e estimulantes sobre o Médio Tejo.
Saravá doutor IGOR!!!!
ma
(1) expressões retiradas literalmente da obra citada
Foto por este rio acima com a devida vénia
História
grândola- escavação Igreja São Pedro
montalvo e as ciência do nosso tempo
Instituto de História Social (Holanda)
associação de defesa do património santarém
Fontes de História Militar e Diplomática
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Fontes de História politica portuguesa
história Religiosa de Portugal
histórias de Portugal em Marrocos
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Ilhas
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